30.12.11

Os dons de ministério


Introdução

Está escrito: "Há um só corpo e um só Espírito, como também fostes chamados em uma só esperança da vossa vocação; há um só Senhor, uma só fé, um só batismo; um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, e por todos e em todos" (Ef. 4:4-6). Irmãos no Senhor, vós sois membros do corpo de Cristo, sois membros dele desde que crestes no nome do Filho de Deus porque estando unidos ao Senhor pela vossa fé vos tornastes um só espírito com ele.

Nós todos que cremos no Senhor, formamos um único corpo, temos uma única esperança, a da glória, para a qual Deus nos chamou; temos uma mesma fé; temos um mesmo Espírito, o da adopção pelo qual clamamos: Aba! Pai!; recebemos um mesmo batismo, o ministrado por imersão na água em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo; temos um único Senhor, Jesus Cristo, que Deus ressuscitou dos mortos; e temos um único Pai, o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo. Nenhum de nós tem do que se gloriar diante de Deus, porque todos fomos salvos pela graça de Deus, e não em virtude de boas obras que tivessemos feito; "mas a graça foi dada a cada um de nós segundo a medida do dom de Cristo" (Ef. 4:7), isso significa que cada um de nós tem o seu próprio dom de Deus e consequentemente, como temos dons diferentes uns dos outros, assim não cumprimos todos o mesmo serviço na casa de Deus.

Está escrito: "E ele deu uns como apóstolos, e outros como profetas, e outros como evangelistas, e outros como pastores e doutores, tendo em vista o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para edificação do corpo de Cristo; até que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, ao estado de homem feito, à medida da estatura perfeita de Cristo; para que não mais sejamos meninos, inconstantes, levados ao redor por todo o vento de doutrina, pela fraudulência dos homens, pela astúcia tendente à maquinação do erro; antes, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo" (Ef. 4:11-15). Começando a falar dos dons de ministério, é necessário dizer que "há diversidade de ministérios, mas o Senhor é o mesmo" (1 Cor. 12:5), portanto os ministérios que Deus constituiu na sua igreja são diferentes uns dos outros, mas apesar de serem diferentes no que concerne à sua função, são conferidos pelo mesmo Senhor aos que são chamados por Deus ao ministério. Os ministros de Deus sabem ter recebido do Senhor dons diferentes e reconhecem também que a cada um deles a graça foi dada segundo a medida do dom de Cristo. Como podeis ver é chamada ‘a medida do dom de Cristo’, porque todo o dom de ministério é dado por Cristo Jesus conforme está escrito: "Ele... deu dons aos homens" (Ef. 4:8; Sal. 68:18); os dons de ministério descem também eles do alto porque está escrito: "Toda boa dádiva e todo dom perfeito vêm do alto" (Tiago 1:17). Uma escola bíblica não pode conferir um ministério porque é Deus aquele que opera em nós tanto o querer como o efectuar segundo a sua boa vontade, e porque é Ele mesmo que estabelece um crente num determinado ofício e não os homens. Escuta, irmão: ‘Se tu recebeste um dom de ministério do Senhor, os outros irmãos não poderão não reconhecer a autenticidade dele e não poderão não reconhecer que Deus operou em ti para estabelecer-te seu ministro naquele ofício particular; quem o reconhecer te poderá encorajar a prosseguir pelo caminho em que tu estás, poderá dar-te bons conselhos que farás bem em seguir (se conformes a vontade de Deus para ti); poderás também aprender sãos ensinamentos por um outro ministro de Deus, mas permanece o facto de que quem opera dentro de um homem para fazê-lo perfeito em todo o bem, para que cumpra um ministério é Deus. A instrução de uma escola bíblica não é de modo nenhum indispensável e vos exorto a não considerá-la como tal; quem julga a inscrição numa escola bíblica coisa indispensável para receber um ministério de Deus e para cumpri-lo não é são na fé porque demonstra não considerar o dom de ministério sobrenatural, e nem ainda como uma capacidade que Cristo confere ao seu servo, mas como uma capacidade que se pode adquirir numa escola como qualquer outra capacidade humana, e isso é um erro. Mas então, o que leva muitos a inscreverem-se numa escola bíblica? Muitos daqueles que vão para a escola bíblica, não foram de modo nenhum chamados por Deus para cumprir um ministério, e isso é manifesto; mas está de facto que eles vão para lá na mesma, com o objectivo bem preciso de receber o diploma daquela escola. Mas porque  é que este bocado de papel, chamado diploma, é tido em tão grande consideração e tão desejado por eles? Porque no seio de toda a organização religiosa que se respeite, os títulos e os reconhecimentos dados pelos homens a outros homens (mesmo se não correspondem à verdade) têm o seu peso e a sua importância.

No momento em que aqueles que têm os lugares de comando no seio de uma denominação dizem: ‘Para ser pastor é necessário ter o diploma da escola bíblica’, estai certos que muitos (entre os quais até mesmo alguém que não é de modo nenhum nascido de novo) se sentirão impelidos (não pelo Senhor mas pela sua inveja e pela sua vanglória) a inscreverem-se naquela escola. Hoje, é suficiente ter um diploma e um número de pessoas ao seu seguimento, para serem considerados pastores. Podes ser mesmo um mercenário que não cuida de maneira nenhuma das ovelhas, isso não impedirá a muitos de te chamarem pastor, porque tu fostes reconhecido como tal pelo vértice da organização. Alguns ambicionam o título de pastor porque ter este título significa ter uma posição ‘prestigiosa’ no meio da organização de que fazem parte e de que estão tão orgulhosos de fazer parte. É assim mesmo; está fora de dúvida que muitos homens corruptos, sem escrúpulos, através da escola bíblica, conseguiram com toda a sorte de engano receber o título de pastor (o título, não o ministério de pastor porque nunca foi recebido de Deus) e infiltrar-se na igreja. Eles têm o seu diploma, fizeram os seus estudos, tiveram os seus exames, fizeram o seu estágio, e por isso cumprem a regra; estão sobre a cátedra, naquele lugar tão invejado aos outros por muitos anos; agora são livres de se moverem, de manifestar a sua cobiça, porque sabem que dificilmente serão expulsos da organização.

Paulo disse dele e dos seus cooperadores que eram ministros do Evangelho: "Não que sejamos capazes, por nós, de pensar alguma coisa, como de nós mesmos; mas a nossa capacidade vem de Deus, o qual nos fez também capazes de ser ministros de um novo pacto" (2 Cor. 3:5,6); como podeis ver, Paulo e os seus cooperadores foram capacitados de ser ministros do novo pacto por Deus e não por outros homens, portanto é errado pensar que uma escola bíblica pode comunicar a capacidade de pregar ou a de ensinar a Palavra do Senhor. Nós chegamos, também por experiência, à conclusão que se Deus não dá uma determinada capacidade a um seu filho, este, mesmo se frequentar uma escola bíblica continuará a permanecer privado daquela capacidade.

Agora examinemos como Deus operou em Paulo, para compreender como é Deus que opera naqueles que escolheu para cumprir um ministério ou mais do que um ministério (como no caso de Paulo).

Paulo de Tarso, quanto à carne, viveu Fariseu e foi criado aos pés de Gamaliel, educado na rígida observância da lei dos pais. Um dia, quando ele ia para Damasco, para perseguir os discípulos do Senhor, teve uma visão em que lhe apareceu Jesus, que lhe disse: "Te apareci por isto, para te pôr por ministro e testemunha tanto das coisas que tens visto como daquelas pelas quais te aparecerei ainda" (Actos 26:16). Saulo, antes que Jesus lhe aparecesse naquele caminho, era um perseguidor da igreja mas a seguir àquela visão se converteu ao Senhor. Na visão que Saulo teve, Jesus lhe disse: "Te apareci por isto, para te pôr por ministro" (Actos 26:16), isso significa que Paulo foi estabelecido ministro do Evangelho pelo Senhor e não pelos homens. Paulo confirmou ter recebido o ministério do Senhor, com estas palavras que ele dirigiu anos depois aos anciãos da igreja de Éfeso: "Mas em nada tenho a minha vida por preciosa, contanto que cumpra com alegria a minha carreira, e o ministério que recebi do Senhor Jesus, para dar testemunho do evangelho da graça de Deus" (Actos 20:24).

Depois que o Senhor lhe apareceu e lhe falou, Saulo foi conduzido a Damasco e aqui depois de três dias e três noites, durante os quais não comeu e não bebeu e durante os quais ficou sem ver, o Senhor lhe enviou um discípulo de nome Ananias para que ele recuperasse a vista e recebesse o Espírito Santo. "E esteve Saulo alguns dias com os discípulos que estavam em Damasco. E logo nas sinagogas pregava a Jesus, que este era o Filho de Deus" (Actos 9:19,20). Saulo não tinha aindo conhecido nenhum dos apóstolos do Senhor, mas já pregava com franqueza nas sinagogas de Damasco; Deus tinha começado a sua obra em Paulo. A este ponto é necessário dizer duas coisas: a primeira é que Paulo, quando Deus lhe revelou o seu Filho, não consultou carne e sangue e não subiu a Jerusalém para estar com os que já antes dele eram apóstolos, de facto ele escreveu aos Gálatas: "Mas, quando aprouve a Deus, que desde o ventre de minha mãe me separou, e me chamou pela sua graça, revelar seu Filho em mim, para que eu o pregasse entre os gentios, não consultei carne e sangue, nem subi a Jerusalém para estar com os que já antes de mim eram apóstolos, mas parti para a Arábia, e voltei outra vez a Damasco" (Gal. 1:15-17); a segunda é que o Evangelho que Paulo anunciava, não o tinha aprendido por nenhum homem, e de facto disse aos Gálatas: "Mas faço-vos saber, irmãos, que o evangelho que por mim foi anunciado não é segundo os homens; porque não o recebi, nem aprendi de homem algum, mas o recebi por revelação de Jesus Cristo" (Gal. 1:11,12). Tudo isto poderá parecer estranho e incompreensível, mas é a verdade, e demonstra que Deus pode fazer, pelo seu poder que opera em nós, infinitamente além daquilo que pedimos ou pensamos. Cuidai que o facto de Paulo não ter recebido o Evangelho de algum homem não significa que os doutores não são necessários na igreja ou que todos aqueles que Deus chama para pregar o Evangelho recebem o Evangelho por revelação de Jesus Cristo; digo isto para que ninguém se engane.

Paulo subiu a Jerusalém só passados três anos para visitar Cefas e esteve com ele quinze dias; nesta ocasião não viu "nenhum outro dos apóstolos, senão a Tiago, irmão do Senhor" (Gal. 1:19). Também em Jerusalém Paulo "pregava ousadamente em nome do Senhor" (Actos 9:29) e como os gregos "procuravam matá-lo..os irmãos, porém, quando o souberam, acompanharam-no até Cesaréia e o enviaram a Tarso" (Actos 9:29,30).

Em Tarso, Paulo esteve um certo tempo, depois Barnabé (que entretanto tinha sido enviado a Antioquia da Síria) foi procurá-lo a Tarso, e encontrando-o, o conduziu a Antioquia, "e sucedeu que todo um ano se reuniram naquela igreja, e ensinaram muita gente" (Actos 11:26). Paulo tinha sido constituído doutor dos Gentios por Cristo, e alguns anos depois já ensinava os santos juntamente com Barnabé em Antioquia. Paulo subiu de novo a Jerusalém depois noutra altura e desta vez subiu com Barnabé e com Tito, a seguir a uma revelação. Ele já pregava o Evangelho aos Gentios quando subiu a Jerusalém. Acerca do seu encontro com Tiago, Cefas e João, que ele chamou "aqueles que pareciam ser alguma coisa" (Gal. 2:6), ele disse: "Nada me comunicaram; antes, pelo contrário, quando viram que o evangelho da incircuncisão me estava confiado, como a Pedro o da circuncisão (porque Aquele que operou eficazmente em Pedro para o apostolado da circuncisão, esse operou também em mim com eficácia para com os Gentios), e conhecendo Tiago, Cefas e João, que eram considerados como as colunas, a graça que se me havia dado, deram-nos as destras, em comunhão comigo e com Barnabé, para que nós fôssemos aos Gentios, e eles à circuncisão" (Gal. 2:6-9). O que vos quero fazer notar é que Tiago, Cefas e João reconheceram que Deus tinha operado em Paulo para constituí-lo apóstolo dos Gentios e também viram a graça de Deus que estava com Paulo, e por isso deram a ele e a Barnabé as destras em comunhão na evangelização; não puderam fazer doutra forma aqueles santos apóstolos cheios de sabedoria. Quis também falar deste encontro que Paulo teve com os que eram considerados colunas, para mostrar-vos como os sábios e sinceros ministros de Deus reconhecem um outro ministro de Deus, mesmo se com este o Senhor agiu de uma maneira diferente, e o recebem (mesmo se não tem carta de recomendação ou a ‘carteirinha’) porque vêem a graça de Deus com ele. No entanto Paulo não tinha estado com Jesus aqueles cerca de três anos, no entanto não tinha aprendido o Evangelho por nenhum homem! Reflecti sobre estas coisas.

Deus ainda hoje, com alguns, opera de uma maneira particular (estranha para alguns, incompreensível para outros, mas absolutamente normal para Deus) para estabelece-los ministros; e isto o faz para demonstrar aos orgulhosos, aos vangloriosos e aos soberbos (àqueles que pensam que sem a formação teológica de uma escola bíblica, reconhecida pela denominação ou até pelo Estado, alguém não possa receber um ministério e não possa ser capaz de cumprí-lo), que Ele não mudou mas permanece o mesmo nos séculos. Deus sabe como humilhar e envergonhar os que se exaltam e a seu tempo o faz. Graças a Deus por aqueles irmãos pobres, definidos pelos sábios segundo a carne ‘homens iletrados e indoutos’, que não sabem o que quer dizer ‘homilética’, que porventura as únicas palavras gregas que conhecem são Christòs e Paraclèto, que porventura do Hebraico não sabem quase nada senão Mashiah, mas foram estabelecidos ministros do Evangelho por Deus, foram ungidos por Deus com o Espírito Santo e cheios da sabedoria de Deus. Eles têm uma conduta exemplar e quando falam, falam com sinceridade da parte de Deus; eles não se assemelham a filósofos quando falam, e nem ainda aos que fazem discursos persuasivos de sabedoria humana para explicar as coisas relativas ao Reino de Deus.

Hoje, alguns se fazem chamar pastores, doutores, evangelistas, mas não são capazes de falar da doutrina de Deus e do Evangelho senão com folhas diante da sua face ou postas no meio das Escrituras ou decorando aquilo que devem dizer para depois recitá-lo em público; só assim conseguem alinhavar um discurso, são tão vazios da Palavra de Deus que se lhes tirais os seus apontamentos não são mais capazes de pregar, porque a palavra de Cristo não habita neles ricamente; o seu coração está exercitado na cobiça e não em receber com mansidão a Palavra. De Jesus, os Judeus quando o ouviam ensinar se maravilhavam e diziam: "Como sabe este letras, sem ter estudado?" (João 7:15); hoje, se vêem e ouvem muitos nas comunidades que fizeram muitos estudos mas não conhecem as Escrituras.

Um homem carpinteiro pôs em alvoroço Israel em apenas três anos. Ele não tinha sido ensinado por nenhum doutor da lei, antes já na idade de doze anos era ele a interrogá-los "e todos os que o ouviam se admiravam da sua inteligência e das suas respostas" (Lucas 2:47); hoje nas igrejas, adultos de muitos anos na fé fazem ficar atónito pela sua ignorância e falta de conhecimento das coisas relativas ao Reino de Deus. Sim irmãos, é assim, e este espectáculo vergonhoso que puseram em pé os vangloriosos e os soberbos está diante dos nossos olhos; os responsáveis são os que procuram a glória dos homens e não a de Deus, são aqueles que querem a sabedoria humana mas recusam a sabedoria de Deus, são sábios segundo este mundo, na realidade sabem filosofia, sabem grego, sabem hebraico, conhecem as leis da física, da economia, mas não conhecem as Escrituras, não conhecem o poder de Deus, não conhecem os caminhos santos de Deus. Estes têm domínio sobre o povo de Deus em virtude da sua posição social e da sua capacidade oratória superior à media, mas são falsos e faladores vãos; não conseguem falar com franqueza mas só com discursos persuasivos da sabedoria humana ou com a excelência de palavras que tanto amam e buscam para parecerem inteligentes e espirituais. Ah! Que miseráveis são estes; pensam que quanto mais complicada for a sua pregação, quanto mais artificioso for o seu discurso mais edificante será, mas se enganam, se iludem. As igrejas em que pregam estão sedentas de ouvir a Palavra de Deus pregada com franqueza porque do púlpito não ouvem mais do que discursos cheios de palavras excelentes e incompreensíveis em muitos pontos para quem não fez muita escola; mas não vedes estas coisas? Os seus discursos são ordenados, subdivididos em diversos pontos que eles chamam conforme se iniciam as palavras que querem comentar, ‘letra A’, ‘letra B’ etc..., mas que discursos bem preparados! Mas eles não edificam; é hora de o Senhor operar também nesta nação como operou antigamente em Israel através dos apóstolos e a minha oração e o meu desejo é que o faça rapidamente, suscitando ainda homens fiéis e santos, cheios de Espírito e de sabedoria, e estendendo a sua mão para confirmar a sua palavra com sinais e prodígios, para que a sua Palavra seja celebrada e para que quem pensa de ser sábio torne-se louco para a glória de Deus.

Vos lembrais daquilo que em Nazaré diziam de Jesus? Está escrito: "Começou a ensinar na sinagoga; e muitos, ouvindo-o, se admiravam, dizendo: De onde lhe vêm estas coisas? E que sabedoria é esta que lhe foi dada? E como se fazem tais maravilhas por suas mãos?" (Mar. 6:2). Jesus teve aquelas coisas de Deus; a sabedoria que tinha lhe foi dada por Deus e as maravilhas feitas pelas suas mãos eram a manifestação do Espírito de Deus, mas qual diploma? Mas que folhas esvoaçantes tinha nas mãos Jesus para pregar? Não tinha nada de tudo isso, mas tinha aquilo que um ministro de Deus deve ter, o poder de Deus e a sabedoria de Deus, a fim de edificar a igreja de Deus.

Deus fez de homens como Pedro, André, Tiago e João que eram pescadores apóstolos, ministros do Evangelho; eles não eram sábios segundo a carne, de facto quando Pedro e João compareceram diante dos principais sacerdotes e dos anciãos, estes perceberam que "eram homens iletrados e indoutos" (Actos 4:13), mas não obstante isso o Espírito Santo falou por meio deles e operou poderosamente através deles. Considerai o que vos digo: quando nós fazemos a leitura das epístolas de Simão Pedro e das de João, nós lemos o que escreveram homens que de profissão eram pescadores. Eles não eram engenheiros ou professores que podiam exibir ‘diplomas’, mas simples pescadores; mas nós somos edificados ao ler as epístolas destes dois apóstolos, enquanto não somos edificados ao ouvir falar aquelas pessoas muito instruídas quando procuram explicar as coisas de Deus com palavras ensinadas pela sabedoria humana.

Irmãos, recordai-vos que Noé era agricultor mas também um "pregador da justiça" (2 Ped. 2:5); Amós, que foi estabelecido profeta por Deus  "estava entre os pastores de Tecoa" (Amós 1:1) e isso o confirmou ele mesmo quando disse: "Era…boieiro, e cultivador de sicômoros. Mas o Senhor me tirou de após o gado, e o Senhor me disse: Vai, e profetiza ao meu povo Israel" (Amós 7:14,15); Eliseu (que Elias  ungiu como profeta em seu lugar por ordem de Deus), quando Elias o encontrou, estava "lavrando com doze juntas de bois adiante dele, e ele estava com a duodécima" (1 Re 19:19); Jeremias quando foi constituído sobre as nações e sobre os reinos para arrancar, para derrubar, para destruir, para arruinar, para edificar e para plantar, não era mais que um menino. Também nesta geração Deus tomou lavradores, pescadores, carpinteiros, lixeiros, sapateiros e muitos outros que possuiam um nível de instrução muito baixo (alguns até analfabetos), e fez deles ministros do Evangelho capazes de pregar com franqueza, com poder e em plena convicção (a alguns deles Deus deu também os dons de curar e o dom de poder de operar milagres), e isto para envergonhar os que se julgam sábios e poderosos, para que eles não se gloriem na sua presença.

O apóstolo

Pelo que respeita ao ministério de apóstolo, é necessário dizer que o apóstolo é o enviado, ou seja, aquele que é enviado pelo Espírito Santo a pregar a Palavra de Deus a um povo.

Tomemos por exemplo os doze discípulos de Jesus que foram por ele estabelecidos apóstolos e enviados por ele a pregar o Reino de Deus a Israel.

Lucas diz: "E aconteceu que naqueles dias subiu ao monte a orar, e passou a noite em oração a Deus. E, quando já era dia, chamou a si os seus discípulos, e escolheu doze deles, a quem também deu o nome de apóstolos: Simão, ao qual também chamou Pedro e André, seu irmão; Tiago e João; Filipe e Bartolomeu; e Mateus e Tomé; Tiago, de Alfeu; e Simão, chamado Zelote; e Judas de Tiago; e Judas Iscariotes, que foi o traidor" (Lucas 6:12-16); como podeis ver os doze não tomaram de eles mesmos a honra de ser chamados apóstolos, mas a tiveram de Cristo Jesus. Notai também que nem todos os que se tinham tornado discípulos de Jesus foram por ele constituídos apóstolos porque isso confirma que nem todos na igreja podem ser chamados apóstolos, mas só os que receberam este ministério do Senhor. Jesus constituiu os doze apóstolos para enviá-los a pregar, e na realidade os enviou a pregar o Reino de Deus com o poder de expulsar os demónios e de sarar qualquer doença, poder que ele mesmo lhes deu, conforme está escrito: "Reunindo os doze, deu-lhes poder e autoridade sobre todos os demônios, e para curarem doenças" (Lucas 9:1).

Depois que o Espírito Santo desceu sobre os discípulos no dia de Pentecostes, houveram outros homens que foram estabelecidos apóstolos pelo Senhor, entre os quais Paulo e Barnabé. Está escrito: "E na igreja que estava em Antioquia havia alguns profetas e doutores: Barnabé e Simeão, chamado Niger, e Lúcio cireneu, e Manaém, que fora criado com Herodes o tetrarca, e Saulo. E enquanto celebravam o culto do Senhor e jejuavam, o Espírito Santo disse: Separai-me a Barnabé e a Saulo para a obra a que os tenho chamado.Então, depois de ter jejuado e orado, imposeram-lhes as mãos, e os despediram. E assim estes, enviados pelo Espírito Santo, desceram a Selêucia e dali navegaram para Chipre..." (Actos 13:1-4); notai que Paulo e Barnabé exercitavam já um ministério na igreja de Antioquia, o de doutor e isto é confirmado também pela Escritura que diz: "Ensinaram muita gente" (Actos 11:26). Um dia, enquanto Barnabé, Simeão, Lúcio cireneu, Manaém e Saulo celebravam o culto do Senhor e jejuavam, o Espírito Santo falou e disse: "Separai-me a Barnabé e a Saulo para a obra a que os tenho chamado" (Actos 13:2); esta ordem foi dirigida aos que estavam reunidos com Barnabé e Saulo, os quais obedeceram, separando-os. Entre aqueles cinco ministros de Deus, o Espírito Santo escolheu apenas Barnabé e Saulo para aquela determinada obra, se bem que os cinco fossem todos ministros de Deus, e isto nos faz compreender que o Senhor opera as suas escolhas segundo o conselho da sua vontade, confiando a quem ele quer uma determinada obra a cumprir. Uma outra coisa que quereria que natasseis é que Barnabé e Saulo são chamados apóstolos (conforme está escrito: "Os apóstolos Barnabé e Paulo" [Actos 14:14]) exactamente porque eles foram "enviados pelo Espírito Santo" (Actos 13:4) a pregar o Evangelho. Pelo que concerne a Paulo, é necessário dizer que Jesus Cristo, quando tempos antes lhe tinha aparecido em visão quando orava no templo, lhe tinha dito: "Vai, porque eu te enviarei para longe, aos Gentios" (Actos 22:21); vos recordo isto para que reconheceis que foi quando Paulo estava em Antioquia que se cumpriram estas palavras que o Senhor lhe tinha dirigido tempo atrás, de facto o Senhor enviou Paulo aos Gentios mediante aquela revelação dada em Antioquia. Os apóstolos Paulo e Barnabé fundaram diversas igrejas durante as suas viagens, muitos foram salvos, muitos foram batizados com o Espírito Santo e Deus deu testemunho da Palavra da sua graça, concedendo que pelas suas mãos se fizessem sinais e prodígios. Muito tempo depois, eles voltaram a Antioquia e "reuniram a igreja, relataram tudo quanto Deus fizera por meio deles, e como abrira aos gentios a porta da fé" (Actos 14:27).

Esta viagem de Paulo e Barnabé, assim como nos foi referida por Lucas, nos faz compreender bem qual é a obra que um apóstolo faz.

Entre os outros apóstolos mencionados pela Escritura estão também Silvano e Timóteo que eram cooperadores de Paulo; que também eles eram apóstolos de Cristo, se percebe por estas palavras de Paulo aos Tessalonicenses. Paulo, depois de ter dito no início da sua primeira epístola: "Paulo, Silvano e Timóteo, à igreja dos tessalonicenses..." (1 Tess. 1:1), disse àqueles crentes: "E não buscamos glória dos homens, nem de vós, nem de outros, ainda que podíamos, como apóstolos de Cristo, ser-vos pesados..." (1 Tess. 2:6).

Paulo disse aos santos de Roma: "Saudai a Andronico e a Júnia, meus parentes e meus companheiros na prisão, os quais se distinguiram entre os apóstolos e que foram antes de mim em Cristo" (Rom. 16:7), portanto também estes dois irmãos eram apóstolos. "E a uns pôs Deus na igreja, primeiramente apóstolos" (1 Cor. 12:28), por isso nós devemos reconhecer o ministério de apóstolo.

Termino de falar-vos deste ministério, dizendo-vos que hoje assim como há os apóstolos de Cristo também há os falsos apóstolos que se transfiguram em apóstolos de Cristo. No seio da igreja de Corinto se tinham infiltrado falsos apóstolos, de facto Paulo, escrevendo àquela igreja, disse daqueles: "Porque tais falsos apóstolos são obreiros fraudulentos, transfigurando-se em apóstolos de Cristo. E não é maravilha, porque o próprio Satanás, se transfigura em anjo de luz. Não é muito pois que os seus ministros se transfigurem em ministros da justiça: o fim dos quais será conforme as suas obras " (2 Cor. 11:13-15). Os falsos apóstolos não são ministros de Cristo, mas ministros de Satanás, portanto odeiam a justiça; mas não obstante isso, conseguem apresentar-se aos fiéis como pessoas justas porque se transfiguram em servos da justiça. As suas obras porém, sendo obras de iniquidade, testemunham contra eles; sabei que estes falsos apóstolos, quando são postos à prova, são achados mentirosos e que o Senhor lhes retribuirá segundo as suas obras.

O profeta

Pelo que diz respeito ao ministério de profeta, Paulo escreveu que Deus constituiu na Igreja "em segundo lugar profetas" (1 Cor. 12:28). Irmãos, sabei que também hoje Deus estabelece alguns como profetas e não poderia ser doutra forma dado que também o de profeta é contado entre os dons de ministério, juntamente com o de apóstolo, de evangelista, de pastor e de doutor. Ora, como se faz para reconhecer quem foi estabelecido por Deus profeta? Quem recebeu o ministério de profeta além de ter o dom de profecia tem também dons de revelação. Os dons de revelação, segundo a Escritura, são a palavra de sabedoria, a palavra de ciência e o discernimento dos espíritos.

O profeta é alguém que tem muitas vezes visões e revelações.

Deus disse a Arão e a Miriã: "Ouvi agora as minhas palavras: se entre vós houver profeta, eu, o Senhor, a ele me farei conhecer em visão, em sonhos falarei com ele" (Num. 12:6); estas palavras de Deus mostram que o profeta recebe visões e sonhos da parte de Deus, tende bem presente isto, porque é uma das coisas que caracteriza o profeta.

Sob o antigo concerto são mencionados muitos profetas e examinando o ministério que receberam vê-se claramente que eles, além de profetizar quando o Espírito Santo descia sobre eles, muitas vezes recebiam visões e revelações da parte de Deus, por meio das quais Deus lhes revelava a sua palavra. Tomemos por exemplo Samuel; está escrito: "E todo o Israel, desde Dã até Berseba, conheceu que Samuel estava confirmado por profeta do Senhor. E continuou o Senhor a aparecer em Siló; porquanto o Senhor se manifestava a Samuel em Siló pela sua palavra. E chegava a palavra de Samuel a todo o Israel" (1 Sam. 3:20,21). Os Israelitas reconheceram que Samuel, embora fosse ainda um jovem, tinha sido constituído profeta por Deus, porque o que Samuel dizia em nome do Senhor se cumpria. Samuel se fez grande e como tudo o que pregava se cumpria, ele era tido em grande honra em Israel. Vejamos agora o que diz a Escritura acerca do encontro de Saul com Samuel para compreender como os dons de revelação estavam presentes no ministério profético de Samuel. Está escrito: "Tinham-se perdido as jumentas de Quis, pai de Saul; pelo que disse Quis a Saul, seu filho: Toma agora contigo um dos servos, levanta-te e vai procurar as jumentas. Passaram, pois, pela região montanhosa de Efraim, como também pela terra de Salisa, mas não as acharam; depois passaram pela terra de Saalim, porém tampouco estavam ali; passando ainda pela terra de Benjamim, não as acharam.Vindo eles, então, à terra de Zufe, Saul disse para o servo que ia com ele: Vem! Voltemos, para que não suceda que meu pai deixe de inquietar-se pelas jumentas e se aflija por causa de nós. Mas ele lhe disse: Eis que há nesta cidade um homem de Deus, e ele é muito considerado; tudo quanto diz, sucede infalivelmente. Vamos, pois, até lá; porventura nos mostrará o caminho que devemos seguir. Então Saul disse ao seu servo: Porém se lá formos, que levaremos ao homem? Pois o pão de nossos alforjes se acabou, e presente nenhum temos para levar ao homem de Deus; que temos? O servo tornou a responder a Saul, e disse: Eis que ainda tenho em mão um quarto dum siclo de prata, o qual darei ao homem de Deus, para que nos mostre o caminho. (Antigamente em Israel, indo alguém consultar a Deus, dizia assim: Vinde, vamos ao vidente; porque ao profeta de hoje, antigamente se chamava vidente.) Então disse Saul ao servo: Dizes bem; vem, pois, vamos! E foram-se à cidade onde estava o homem de Deus.... e, ao entrarem, eis que Samuel lhes saiu ao encontro,  para subir ao alto. Ora, o Senhor revelara isto aos ouvidos de Samuel, um dia antes de Saul chegar, dizendo: Amanhã a estas horas te enviarei um homem da terra de Benjamim, o qual ungirás por príncipe sobre o meu povo de Israel; e ele livrará o meu povo da mão dos filisteus; porque olhei para o meu povo, porque o seu clamor chegou a mim. E quando Samuel viu a Saul, o Senhor lhe disse: Eis aqui o homem de quem eu te falei. Este dominará sobre o meu povo. Então Saul se chegou a Samuel na porta, e disse: Mostra-me, peço-te, onde é a casa do vidente. Respondeu Samuel a Saul: Eu sou o vidente; sobe diante de mim ao alto, e comei hoje comigo; pela manhã te despedirei, e tudo quanto está no teu coração to declararei.Também quanto às jumentas que há três dias se te perderam, não te preocupes com elas, porque já foram achadas..." (1 Sam. 9:3-10; 14-20).

O povo de Israel tinha pedido um rei, e Deus tomou Saul e o enviou ao profeta Samuel para que este o ungisse para reinar sobre Israel.

Deus fez chegar Saul a Samuel servindo-se primeiro das jumentas do pai de Saul, e depois do servo que tinha ido com Saul à procura das jumentas. As jumentas de Quis tinham-se perdido por vontade de Deus, e o pai de Saul enviou Saul e um servo seu à procura das jumentas. Estes foram e não as encontraram porque Deus não permitiu que as achassem; vendo isto, Saul pensou voltar para casa, mas o seu servo lhe propôs antes ir ao homem de Deus o qual poderia lhes indicar o caminho a seguir para achar as jumentas. Saul se deixou persuadir, e ele e o seu servo foram à cidade onde morava Samuel. No dia anterior que aconteceu este encontro entre Saul e Samuel, Deus tinha dado a Samuel uma palavra de sabedoria (a palavra de sabedoria é a revelação de um facto que deve acontecer), dizendo-lhe que no dia seguinte (à mesma hora em que ele tinha recebido a revelação no dia anterior) lhe enviaria um homem da tribo de Benjamim que ele deveria ungir como príncipe do povo de Israel. No dia seguinte a esta revelação, à hora estabelecida por Deus, Samuel viu Saul que se aproximava dele, e antes que Saul perguntasse a Samuel onde habitava o vidente, Deus disse a Samuel que o homem de que lhe tinha falado era ele. Quando Samuel encontrou Saul, lhe disse que as jumentas perdidas foram achadas; neste caso, Samuel teve de Deus uma palavra de ciência (a palavra de ciência é a revelação de um facto já acontecido ou que está acontecendo enquanto o profeta fala). No dia seguinte, à alba, antes que Saul voltasse para sua casa, Samuel ungiu de azeite Saul, o beijou e lhe anunciou coisas que lhe aconteceriam naquele preciso dia; neste caso, Samuel teve do Senhor de novo uma palavra de sabedoria. Ele disse a Saul: "Quando te apartares hoje de mim, encontrarás dois homens junto ao sepulcro de Raquel, no termo de Benjamim, em Zelza, os quais te dirão: Acharam-se as jumentas que foste buscar, e eis que já o teu pai deixou de pensar nas jumentas, e anda aflito por causa de vós, dizendo: Que farei eu por meu filho? E quando dali passares mais adiante, e chegares ao carvalho de Tabor, ali te encontrarão três homens, que vão subindo a Deus, a Betel: um levando três cabritos, o outro três bolos de pão, e o outro um odre de vinho. Eles te saudarão, e te darão dois pães, que receberás das mãos deles. Depois chegarás ao outeiro de Deus, onde está a guarnição dos filisteus; e há de ser que, entrando ali na cidade, encontrarás um grupo de profetas descendo do alto, precedidos de saltérios, tambores, flautas e harpas, e profetizarão. E o Espírito do Senhor se apoderará de ti, e profetizarás com eles, e serás transformado em outro homem..." (1 Sam. 10:2-6); também esta palavra de sabedoria se cumpriu, de facto está escrito que "todos aqueles sinais aconteceram naquele mesmo dia" (1 Sam. 10:9). Por estas Escrituras aqui supracitadas é manifesto que o dom de palavra de sabedoria e o dom de palavra de ciência operavam no ministério de Samuel. Mas além destes dons, Samuel tinha também o dom de profecia (por isso profetizava, e vos recordo que quem profetiza "fala aos homens para edificação, exortação e consolação" [1 Cor. 14:3]). Samuel tinha a presidência da congregação dos profetas, de facto quando Saul enviou mensageiros para prenderem Davi a Naiote, em Ramá, estes "viram uma congregação de profetas profetizando, onde estava Samuel que presidia sobre eles" (1 Sam. 19:20); isto confirma que o profeta Samuel tinha o dom de profecia. Resumindo, Samuel profetizava e recebia muitas vezes seja uma palavra de sabedoria, seja uma palavra de ciência, naturalmente quando queria o Espírito Santo e não quando queria ele, porque também debaixo do antigo concerto estes dons do Espírito Santo eram distribuídos segundo a vontade de Deus. Alguém dirá: ‘Mas então também debaixo do antigo concerto eram dados os dons do Espírito Santo?’ Sim, com certeza, porque também naquela altura se manifestava o Espírito de Deus; porém é bom precisar que dentre todos os dons espirituais faltavam o dom da diversidade de línguas e o da interpretação de línguas, porque eles começaram a ser distribuídos do dia de Pentecostes (no qual o Espírito Santo foi derramado sobre a igreja de Deus) em diante.

Quero mencionar-vos também o profeta Eliseu para vos fazer compreender como os dons de revelação estão presentes em quem exercita o ministério de profeta.

A Escritura narra o que Geazi, servo de Eliseu, fez escondido, depois que  Naamã o Siro foi curado da sua lepra e depois que Eliseu recusou aceitar os dons que Naamã lhe queria dar; está escrito: "Geazi, servo de Eliseu, o homem de Deus, disse: Eis que meu senhor poupou a este sírio Naamã, não recebendo da mão dele coisa alguma do que trazia; vive o Senhor, que hei de correr atrás dele, e receber dele alguma coisa. E foiGeazi em alcance de Naamã; e Naamã, vendo que corria atrás dele, saltou do carro a encontrá-lo, e disse-lhe: Vai tudo bem?’ Respondeu ele: Tudo vai bem. Meu senhor me mandou dizer-te: Eis que agora mesmo vieram a mim dois mancebos dos filhos dos profetas da região montanhosa de Efraim; dá-lhes, pois, um talento de prata e duas mudas de vestidos roupa. E disse Naamã: Sê servido de tomar dois talentos. E instou com ele, e amarrou dois talentos de prata em dois sacos, com duas mudas de vestidos, e pô-los sobre dois dos seus servos, os quais os levaram adiante de Geazi. Tendo ele chegado à colina, tomou os sacos das suas mãos e os depositou na casa; e despediu aqueles homens, e eles se foram" (2 Re 5:20-24); ora Geazi mentindo a Naamã se apropriou de alguns bens materiais e tudo isso escondido de Eliseu, depois foi apresentar-se diante de Eliseu. E "disse-lhe Eliseu: ‘Donde vens, Geazi?’ Respondeu ele: Teu servo não foi a parte alguma. Eliseu porém, lhe disse: Porventura não foi contigo o meu coração, quando aquele homem se voltou e desceu do seu carro ao teu encontro? Era isto ocasião para tomares prata e para tomares vestidos, e olivais, e vinhas, e ovelhas, e bois e servos e servas? Portanto a lepra de Naamã se pegará a ti e à tua descendência para sempre. Então Geazi saiu da presença de Eliseu, leproso, branco como a neve" (2 Re 5:25-27).

Eliseu recebeu de modo sobrenatural o conhecimento do pecado que Geazi tinha cometido escondido; esta foi uma palavra de ciência que Deus, pelo Espírito, lhe deu naquela ocasião.

Para demonstrar-vos que Eliseu era capaz de conhecer factos que tinham acontecido na vida dos outros, só se e quando Deus o queria, vos recordo este episódio. Eliseu um dia tinha dito a uma mulher rica de Suném que não tinha filhos: "Por este tempo, no próximo ano, abraçarás um filho" (2 Re 4:16). "E concebeu a mulher, e deu à luz um filho, no  tempo determinado, no ano seguinte como Eliseu dissera. Tendo o menino crescido, saiu um dia a ter com seu pai, que estava com os segadores. Disse a seu pai: Ai, a minha cabeça! Ai, a minha cabeça! Então ele disse a um servo: Leva-o à sua mãe. Este o tomou, e o levou a sua mãe; e o menino esteve sobre os joelhos dela até o meio-dia, e então morreu. E ela subiu, deitou-o sobre a cama do homem de Deus, fechou a porta e saiu. E chamou a seu marido, e disse: Manda-me, peço-te, um dos servos e uma das jumentas, para que eu corra ao homem de Deus e volte. Disse ele: Porque queres ir ter com ele hoje? Não é lua nova nem sábado. E ela disse: Tudo vai bem. Então ela fez albardar a jumenta, e disse ao seu servo: Guia e anda, e não me detenhas no caminhar, senão quando eu to disser. Partiu ela, pois, e foi ter com o homem de Deus, ao monte Carmelo; e sucedeu que, vendo-a de longe o homem de Deus, disse a Geazi, seu servo: Eis aí a sunamita; agora, pois, corre-lhe ao encontro e diz-lhe: Vais bem? Vai bem teu marido? Vai bem teu filho? Ela respondeu: Vai bem. Chegando ela ao monte, à presença do homem de Deus, apegou-se-lhe aos pés. Chegou-se Geazi para a retirar, porém, o homem de Deus lhe disse: Deixa-a, porque a sua alma está em amargura, e o Senhor mo encobriu, e não mo manifestou" (2 Re 4:17-27).

O facto de Eliseu dizer ao seu servo para perguntar à Sunamita se o seu menino estava bem mostra que Eliseu não sabia que ele tinha morrido, e de facto pouco depois disse a Geazi: ‘o Senhor mo encobriu, e não mo manifestou’. Estas palavras de Eliseu mostram que ele vinha a conhecer factos encobertos de modo sobrenatural pelo Espírito de Deus, e que se o Senhor não lhe dava uma palavra de ciência acerca de um facto acontecido, aquele facto permanecia encoberto também para ele.

Numa outra ocasião, enquanto na cidade de Samaria havia fome porque estava cercada pelo exército da Síria, "disse Eliseu: Ouvi a palavra do Senhor; assim diz o Senhor: Amanhã, por estas horas, haverá uma medida de farinha por um siclo, e duas medidas de cevada por um siclo, à porta de Samaria" (2 Re 7:1); neste caso Eliseu teve uma palavra de sabedoria, e o que ele predisse, no dia seguinte se cumpriu, porque Deus operou um prodígio durante a noite, fazendo fugir os Sírios que cercavam a cidade, e "houve uma medida de farinha por um siclo e duas medidas de cevada por um siclo, conforme a palavra do Senhor" (2 Re 7:16). Tenho a dizer que quando Deus revela a um seu servo profeta uma palavra de ciência ou uma palavra de sabedoria ela é veraz e não é em nada a palavra de um homem, mas a de Deus e estes exemplos o mostram claramente.

Vejamos agora como Jesus proferiu uma palavra de ciência enquanto falava com uma mulher samaritana. Um dia, Jesus, enquanto falava com uma mulher samaritana, disse-lhe: "Vai, chama o teu marido e vem cá. A mulher respondeu, e disse: Não tenho marido. Disse-lhe Jesus: Disseste bem: Não tenho marido; porque tiveste cinco maridos, e o que agora tens não é teu marido; isto disseste com verdade. Disse-lhe a mulher: Senhor, vejo que és profeta." (João 4:16-19). Como fez Jesus para saber que esta mulher não tinha marido, e que tinha tido cinco maridos e que o que tinha naquele tempo não era seu marido? Jesus, pelo Espírito, recebeu uma palavra de ciência que dizia respeito a esta mulher; não vos esqueceis que Jesus era um homem que cumpriu o seu ministério de profeta pela ajuda do Espírito de Deus.

A mulher samaritana, quando Jesus lhe disse aquelas palavras, lhe disse: ‘Senhor, vejo que és profeta’; reflecti nestas palavras. Aquela mulher reconheceu por aquela palavra que Jesus lhe disse que Ele era um profeta e devemos dizer que de modo nenhum se enganou; aquela mulher sabia que só um profeta poderia dizer-lhe tudo o que ela tinha feito. Depois que Jesus lhe disse as outras palavras, ela deixou o seu cântaro, e foi à cidade e disse às pessoas: "Vinde, vede um homem que me disse tudo quanto eu tenho feito; não será este, porventura, o Cristo?" (João 4:29) A palavra de ciência dita por Jesus àquela mulher teve um efeito positivo porque levou aquela mulher e muitos dos samaritanos daquela cidade a crer nele, na realidade está escrito que "muitos samaritanos daquela cidade creram nele, por causa da palavra da mulher, que testificava: Ele me disse tudo quanto tenho feito" (João 4:39).

No livro dos actos dos apóstolos, Lucas fala de um certo profeta Ágabo, e daquilo que ele predisse pelo Espírito em duas ocasiões diversas; vejamos agora quais foram estas suas predições. Está escrito: "Naqueles dias desceram profetas de Jerusalém para Antioquia; e levantando-se um deles, de nome Ágabo, dava a entender pelo Espírito, que haveria uma grande fome por todo o mundo, a qual ocorreu no tempo de Cláudio" (Actos 11:27,28); Ágabo era profeta e recebeu uma palavra de sabedoria que dizia respeito a uma grande fome que haveria nos dias vindouros sobre toda a terra. As palavras "dava a entender pelo Espírito" (Actos 11:28), explicam claramente que não é segundo o espírito do homem ou por um conhecimento adquirido de modo natural ou por intuição que o profeta prediz o que acontecerá, mas pelo Espírito Santo, quando e se quer o Espírito Santo, de facto Paulo escreveu aos Coríntios: "A um, pelo Espírito, é dada a palavra de sabedoria" (1 Cor. 12:8). Alguém dirá: ‘Mas para que serviu aquela palavra de sabedoria? Ela foi útil, porque tudo o que o Espírito Santo revela é útil à Igreja, conforme está escrito: "Mas a manifestação do Espírito é dada a cada um, para o que for útil" (1 Cor. 12:7). No caso da predição da grande fome, está escrito que "os discípulos determinaram mandar, cada um conforme o que pudesse, socorro aos irmãos que habitavam na Judeia, o que eles com efeito fizeram, enviando-o aos anciãos, por mão de Barnabé e de Saulo" (Actos 11:29,30); esta revelação moveu os discípulos de Antioquia a enviar socorro aos irmãos necessitados que estavam na Judeia.

Numa outra ocasião, o profeta Ágabo predisse pelo Espírito o que aconteceria a Paulo em Jerusalém, quando Paulo ainda estava em Cesaréia. Lucas disse: "Demorando-nos ali por muitos dias, desceu da Judéia um profeta, de nome Ágabo; e vindo ter conosco, tomou a cinta de Paulo e, ligando os seus próprios pés e mãos, disse: Isto diz o Espírito Santo: Assim os judeus ligarão em Jerusalém o homem de quem é esta cinta, e o entregarão nas mãos dos gentios" (Actos 21:10,11). Deus fez saber a Paulo, através do profeta Ágabo, que os Judeus o prenderiam em Jerusalém e que eles o entregariam nas mãos dos Gentios, portanto quando depois em Jerusalém, os Judeus prenderam Paulo no templo e se puseram a bater-lhe com o objectivo de matá-lo, Paulo já sabia que os Judeus não o matariam naquela ocasião porque eles o haveriam de entregar nas mãos dos Gentios.

Irmãos, não subvalorizeis as revelações divinas porque de tal modo subvalorizais a palavra de Deus. Quero recordar-vos que os antigos profetas recebiam muitas vezes a palavra de Deus em visões; estas expressões: "Palavra que Isaías, filho de Amoz, teve em visão, a respeito de Judá e de Jerusalém" (Is. 2:1); "O oráculo que o profeta Habacuque teve por visão." (Hab. 1:1); "A palavra do Senhor que veio a Miquéias, o Morastita, nos dias de Jotão, Acaz e Ezequias reis de Judá a qual ele teve em visão sobre Samária e Jerusalém" (Miq. 1:1), e muitas outras concernentes a outros profetas demonstram como os profetas recebiam visões da parte de Deus.

Muitas vezes Deus revelou a sua palavra aos seus profetas também sem o auxílio de visões, fazendo-os ouvir claramente a sua voz e as Escrituras que indicam este modo de comunicar a palavra por parte de Deus são estas: "A palavra do Senhor veio a Elias, no terceiro ano, dizendo..." (1 Re 18:1); "Estando eles à mesa, a palavra do Senhor veio ao profeta..." (1 Re 13:20); neste caso, mesmo se o profeta estava na companhia de outras pessoas a voz do Senhor a ouvia somente ele.

Deus hoje por meio dos seus profetas revela palavras dirigidas à igreja e a indivíduos, isto significa que também hoje, quando Deus o quer, manda um profeta levar uma específica palavra seja a uma igreja, seja a um indivíduo. No profeta operam o dom de profecia juntamente com  pelo menos dois dos três dons de revelação. No dom de profecia não há a revelação de um evento futuro como há ao invés no dom de palavra de sabedoria, doutra forma cessaria de ser diferente do dom de palavra de sabedoria. Recordai-vos que há diferença entre os dons espirituais e que não há dois iguais entre eles, porque está escrito que "há diversidade de dons" (1 Cor. 12:4). Como há diferença entre o dom da diversidade de línguas e o dom da interpretação de línguas, assim há diferença também entre o dom de profecia e os dons de revelação. O profeta tem o dom de profecia e nós sabemos que quem profetiza "fala aos homens para edificação, exortação e consolação" (1 Cor. 14:3). Vos darei exemplos tirados das Escrituras para vos fazer entender este dom do Espírito Santo. Isaías, profeta de Deus, pelo Espírito, (em profecia) proferiu aos homens estas palavras de edificação: "Inclinai os ouvidos, e ouvi a minha voz; estai atentos, e ouvi a minha palavra. Porventura lavra continuamente o lavrador, para semear? ou está sempre abrindo e esterroando a sua terra? Quando já tem nivelada a sua superfície, não espalha ele a nigela, não semeia o cominho, não lança nela o trigo em leiras, ou cevada no lugar determinado, ou a espelta na margem? o seu Deus o ensina e o instrui acerca do que há-de fazer. Porque a nigela não se trilha com instrumento de trilhar, nem sobre o cominho passa a roda de carro; mas a nigela é debulhada com uma vara, e o cominho com um pau. Se trilha o trigo; mas não o se trilha continuamente; nem se faz passar sobre ele a roda do carro e os cavalos, mas não se esmiúça. Até isto procede do Senhor dos exércitos; maravilhosos são os seus desígnios, grande é a sua sabedoria" (Is. 28:23-29). Estas palavras aqui supracitadas são um exemplo de linguagem de edificação dito em profecia por um profeta; como podeis ver nestas palavras não há a predição de um facto específico.

Um exemplo de linguagem de exortação é este: "Lembrai-vos, disto, e considerai; trazei-o à memória, ó transgressores!... Ao Senhor dos exércitos, a ele santificai; e seja ele o vosso temor e seja ele o vosso assombro!... Lavai-vos, purificai-vos, tirai de diante dos meus olhos a maldade dos vossos atos; cessai de fazer o mal; aprendei a fazer o bem; buscai a justiça, ajudai o oprimido, fazei justiça ao órfão, defendei a causa da viúva" (Is. 46:8; 8:13; 1:16,17); também nestas palavras proferidas em profecia não há o anúncio de um particular evento que deve suceder.

Um exemplo de linguagem de consolação proferido em profecia é este: "Eu, eu sou aquele que vos consola; quem pois és tu, para que temas o homem, que é mortal, ou o filho do homem que se tornará feno?... Ouvi-me, vós que conheceis a justiça, vós, povo, em cujo coração está a minha lei; não temais o opróbrio dos homens, nem vos turbeis pelas suas injúrias. Porque a traça os roerá como a um vestido, e o bicho os comerá como à lã... Não temas, porque eu te remi; chamei-te pelo teu nome, tu és meu. Quando passares pelas águas, eu serei contigo; quando pelos rios, eles não te submergirão; quando passares pelo fogo, não te queimarás, nem a chama arderá em ti" (Is. 51:12; 51:7,8; 43:1,2); também nestas palavras não há o anúncio de um evento futuro, como uma fome, uma guerra, o nascimento de alguém, a morte de alguém, etc...

Sabei que quando Deus, por meio de um profeta, dirige uma palavra de exortação a um indivíduo, se este aceita a palavra que o profeta lhe diz em nome do Senhor e se submete à vontade de Deus receberá o bem, mas se a rejeita, ele receberá a pena da sua rebelião.

Quero que saibais também que Deus julga aqueles seus profetas que têm a presunção de dizer coisas em seu nome que ele não lhes mandou dizer; o nosso Deus é santo e a falsidade, mesmo se é praticada por um profeta seu, é abominável aos seus olhos. Deus diz: "O profeta que tiver a presunção de falar em meu nome alguma palavra que eu lhe não tenha mandado falar, ou o que falar em nome de outros deuses, o tal profeta morrerá" (Deut. 18:20); estas palavras escritas na lei nos fazem compreender claramente quanto é grave a culpa de um profeta que faz falar a sua língua, e diz ‘O Senhor diz’, quando o Senhor não disse nada.

Deus diz também: "E se disseres no teu coração: Como conheceremos a palavra que o Senhor não falou? Quando o tal profeta falar em nome do Senhor, e tal palavra se não cumprir, nem suceder assim, esta é a palavra que o Senhor não falou; com presunção a falou o tal profeta, não tenhas temor dele" (Deut. 18:21,22); irmãos, para saber se aquilo que o profeta predisse em nome do Senhor é uma palavra que Deus não disse, é necessário esperar, porque quando a palavra do profeta não se cumpre, isso significa que aquela não era a palavra de Deus, mas uma palavra dita por presunção do profeta.

O que um profeta de Deus diz em nome do Senhor deve ser examinado e julgado com as Escrituras, conforme está escrito: "Falem dois ou três profetas, e os outros julguem" (1 Cor. 14:29); alguém dirá: ‘Mas porque deve ser examinado?’ Porque o profeta poderia dizer alguma coisa de falso seguindo o seu próprio espírito. Paulo disse aos Tessalonicenses: "Não desprezeis as profecias; examinai tudo e retende o bem; abstendo-vos de toda a aparência do mal" (1 Tess. 5:20-22); as profecias (sejam as profecias dos profetas como as profecias dos que não têm o ministério de profeta, mas apenas o dom de profecia) devem ser examinadas e aceitadas quando estão perfeitamente de acordo ao que a Sagrada Escritura ensina; em caso contrário, isto é, em caso da profecia contrastar a verdade, ela deve ser rejeitada sem exitar. No curso dos séculos, surgiram homens no seio da igreja de Deus que disseram profecias (ou de ter tido visões e revelações da parte de Deus) que se opunham à Palavra de Deus, e houveram os que lhes deram ouvidos e foram enganados pelas suas mentiras, por isso irmãos, como disse Paulo: "Examinai tudo e retende o bem" (1 Tess. 5:21), mas o bem somente; o mal reprovai-o!

Eis um facto que aconteceu nos dias de Jeremias, que nos ensina como um profeta pode fazer falsas predições. Está escrito no livro de Jeremias: "E sucedeu no mesmo ano, no princípio do reinado de Zedequias, rei de Judá, no ano quarto, no mês quinto, que Hananias, filho de Azur, o profeta de Gibeão, me falou, na casa do Senhor, na presença dos sacerdotes e de todo o povo dizendo: Assim fala o Senhor dos exércitos, o Deus de Israel, dizendo: Eu quebrarei o jugo do rei de Babilônia. Dentro de dois anos, eu tornarei a trazer a este lugar todos os vasos da casa do Senhor, que deste lugar tomou Nabucodonosor, rei de Babilônia, levando-os para Babilônia. Também a Jeconias, filho de Jeoiaquim rei de Judá, e a todos os do cativeiro de, Judá, que entraram em Babilônia, eu os tornarei a trazer a este lugar, diz o Senhor; porque quebrarei o jugo do rei de Babilônia. Então falou o profeta Jeremias ao profeta Hananias, na presença dos sacerdotes, e na presença de todo o povo que estava na casa do Senhor. Disse pois Jeremias, o profeta: Amém! assim faça o Senhor; cumpra o Senhor as tuas palavras, que profetizaste, e torne ele a trazer os vasos da casa do Senhor, e todos os do cativeiro, de Babilônia para este lugar. Mas ouve agora esta palavra, que eu falo aos teus ouvidos e aos ouvidos de todo o povo: Os profetas que houve antes de mim e antes de ti, desde a antigüidade, profetizaram contra muitos países e contra grandes reinos, a guerra, a fome e peste. Quanto ao profeta que profetizar paz, quando se cumprir a palavra desse profeta, então será reconhecido como um verdadeiro enviado do Senhor. Então o profeta Hananias tomou o jugo do pescoço do profeta Jeremias e o quebrou. E falou Hananias na presença de todo o povo, dizendo: Isto diz o Senhor: Assim dentro de dois anos quebrarei o jugo de Nabucodonosor, rei de Babilônia, de sobre o pescoço de todas as nações. E Jeremias, o profeta, se foi seu caminho. Então veio a palavra do Senhor a Jeremias, depois de ter o profeta Hananias quebrado o jugo de sobre o pescoço do profeta Jeremias, dizendo: Vai, e fala a Hananias, dizendo: Assim diz o Senhor: Jugos de madeira quebraste, mas em vez deles fiz jugos de ferro. Porque assim diz o Senhor dos exércitos, o Deus de Israel: Jugo de ferro pus sobre o pescoço de todas estas nações, para servirem a Nabucodonosor, rei de Babilônia, e o servirão; e até os animais do campo lhe dei. Então disse o profeta Jeremias ao profeta Hananias: Ouve agora, Hananias: O Senhor não te enviou, mas tu fazes que este povo confie na mentira. Pelo que assim diz o Senhor: Eis que te lançarei de sobre a face da terra. Este ano morrerás, porque falaste em rebeldia contra o Senhor. E morreu Hananias, o profeta, no mesmo ano, no sétimo mês" (Jer. 28:1-17).

Irmãos, lendo aquilo que está escrito antes deste episódio, notareis que Deus tinha dito ao povo por meio de Jeremias: "Não deis ouvidos às palavras dos vossos profetas, que vos profetizam dizendo: Eis que os vasos da casa do Senhor cedo voltarão de Babilónia; pois eles vos profetizam mentiras" (Jer. 27:16). O profeta Hananias profetizou ao povo que Deus faria voltar dalí a pouco tempo, os vasos do templo de Babilónia, e outras coisas agradáveis de ouvir; ele falou por presunção e fez o povo confiar na mentira, e Deus o puniu, fazendo-o morrer. Esta história nos ensina que Deus não pode negar-se a si mesmo; Ele não muda a palavra saída da sua boca porque "não é homem, para que minta, nem filho de homem, para que se arrependa" (Num. 23:19). Deus não vai contra a sua palavra, antes a confirma; são os temerários que contrastam a Palavra de Deus, e o fazem usando o nome do Senhor. Alguns profetizam coisas agradáveis de ouvir, coisas em si mesmas belas, mas ao mesmo tempo falsas; acontece também isto no seio da irmandade. Alguns com a sua língua, usando o nome do Senhor, predisseram a cura de irmãos gravemente doentes, mas aquela cura nunca se cumpriu, porque os doentes morreram pouco tempo depois; outros, predisseram matrimónios entre pessoas que nunca se casaram, ou porque um dos dois morreu logo depois ou porque Deus quis que se casassem com pessoas diferentes. Depois há as profecias que dizem para a mulher ensinar, enquanto a Palavra de Deus diz: "Não permito que a mulher ensine" (1 Tim. 2:12); as que dizem que também se a mulher ora a Deus sem estar coberta não faz nada de mal ou que dizem que também se se adorna com jóias de ouro e de vestidos luxuosos não faz nada de mal porque Deus ‘olha ao coração’; a estas se acrescentam as profecias que dizem a pessoas divorciadas que podem se casar; nós todas estas profecias as rejeitamos, porque vão contra a Palavra de Deus e portanto não podem proceder da boca de Deus. Não é o Espírito da verdade que profere estas profecias, mas o espírito do erro.

Há uma outra história que mostra como Deus não pode negar a sua Palavra anteriormente dita; é a história daquele profeta que veio de Judá a Betel, por ordem de Deus, enquanto o rei Jeroboão oferecia incenso sobre o altar que tinha feito construir. O profeta proferiu a palavra de Deus contra o altar e deu um sinal miraculoso da parte de Deus naquele mesmo dia, e aquele sinal se cumpriu; mas Deus tinha dito a este profeta para não comer pão e para não beber água em Betel e para não voltar pela mesma estrada que tinha ido. Depois que o profeta falou da parte de Deus: e deu o sinal miraculoso da parte de Deus, "o rei disse ao homem de Deus: Vem comigo a minha casa, e conforta-te, e dar-te-ei um presente. Porém o homem de Deus disse ao rei: Ainda que me desses metade da tua casa, não iria contigo, nem comeria pão nem beberia água neste lugar. Porque assim me ordenou o Senhor pela sua palavra, dizendo: Não comerás pão nem beberás água, e não voltarás pelo caminho por onde foste. E foi-se por outro caminho, e não voltou pelo caminho, por onde viera a Betel. E morava em Betel um velho profeta; e veio seu filho, e contou-lhe tudo o que o homem de Deus fizera naquele dia em Betel, e as palavras que dissera ao rei; e as contaram a seu pai. E disse-lhes seu pai: Por que caminho se foi? E viram seus filhos o caminho por onde fora o homem de Deus que viera a Judá. Então disse a seus filhos: Albardai-me um jumento. E albardaram-lhe o jumento, e montou nele. E foi-se após o homem de Deus, e o achou sentado debaixo de um carvalho, e perguntou-lhe: És tu o homem de Deus que vieste de Judá? Respondeu ele: Sou. Então lhe disse: Vem comigo a casa, e come pão. Porém ele disse: Não posso voltar contigo, nem entrarei contigo; nem tampouco comerei pão, nem beberei  contigo água neste lugar; porque me foi mandado pela palavra do Senhor: Ali não comerás pão, nem bebarás água, nem tornarás a ir pelo caminho por que foste. E ele lhe disse: Também eu sou profeta como tu, e um anjo me falou por ordem do Senhor, dizendo: Faze-o voltar contigo à tua casa, para que coma pão e beba água. (Porém mentiu-lhe.) E tornou ele, e comeu pão em sua casa, e bebeu água. Estando eles à mesa, a palavra do Senhor veio ao profeta que o tinha feito voltar; e clamou ao homem de Deus que viera de Judá, dizendo: Assim diz o Senhor: Porquanto foste rebelde à ordem do Senhor, e não guardaste o mandamento que o Senhor teu Deus te mandara, antes voltaste, e comeste pão e bebeste água no lugar de que te dissera: Não comerás pão, nem beberás água; o teu cadáver não entrará no sepulcro de teus pais. E, sucedeu que, depois que comeu pão, e depois que bebeu, albardou ele o jumento para o profeta que fizera voltar. Foi-se, pois, e um leão o encontrou no caminho, e o matou" (1 Re 13:7-24).

Irmãos, como podeis ver, ao convite do rei Jeroboão que tinha uma conduta ímpia diante de Deus, o profeta recusou fazer aquilo que o rei lhe propôs fazer para não desobedecer a Deus; a seguir, no primeiro convite do velho profeta, o homem de Deus mostrou ainda a mesma firmeza não aceitando em voltar a casa do velho profeta para comer e beber, mas quando o velho profeta o viu firme e decidido a não voltar atrás à sua casa, recorreu à mentira, dizendo-lhe: "Um anjo me falou por ordem do Senhor, dizendo: Faze-o voltar contigo à tua casa, para que coma pão e beba água" (1 Re 13:18), e então o homem de Deus voltou para trás. O homem de Deus ouviu que a dita ‘nova ordem’ de Deus contrastava nitidamente a primeira, mas às palavras: "Também eu sou profeta como tu, e um anjo me falou por ordem do Senhor" (1 Re 13:18), não se opôs como tinha feito antes e creu na mentira e desobedeceu a Deus. Quando Satanás não consegue enganar os filhos de Deus por meio da gente má que não tem a fé, então procura enganá-los por meio de mentiras proferidas pela boca de alguns crentes que ainda não baniram a mentira. Alguns, quando te vêem firme na Palavra de Deus, e que não entras em compromisso com ninguém, também atendendo às sagradas Escrituras, para procurar dissuadir-te de certos preceitos de Deus, verazes e justos como todos os outros (mas que a eles não agrada), então excogitam para persuadir-te do contrário da Palavra de Deus, fazendo uso de falsas profecias, isto é, de mentiras, usando o nome do Senhor, exactamente como fez aquele velho profeta com o homem de Deus vindo de Judá. Há quem começa a dizer: ‘Também eu sou um ministro do Evangelho como tu e Deus me falou, dizendo-me que esta ordem era só para os crentes daquela época e não para nós hoje’; outros: ‘Tive um sonho da parte de Deus que me mostrou que não é como tu dizes, porque Deus quer que nós nos adequemos aos tempos’, tantas mentiras para te dizer para não creres naquilo que Jesus disse ou que Paulo e os outros apóstolos mandaram fazer, mas como não te querem dizer claramente: ‘Desobedece a Deus e à sua palavra’, assim te o dizem fazendo uso de mentiras, apoiando-se em palavras como ‘visões’, ‘sonho’, ‘profecia’, ‘revelação’, palavras que suscitam interesse quando são pronunciadas, mas também um certo temor de Deus; mas quando nos apercebermos que aquelas palavras são usadas somente para fins desonestos, para nos desviar dos mandamentos de Deus, então, com firmeza respondamos a estes: ‘O que vós dizeis é falso, porque se opõe à Palavra de Deus’. Sabei que Deus não repensou a sua doutrina nestes últimos tempos; Ele não mudou de ideias, com o passar do tempo, sobre nenhum dos seus preceitos dado por meio de seu Filho e por meio dos apóstolos. Ninguém vos engane, cuidai de vós mesmos, porque os tempos são dificeis e maus; Paulo disse a Timóteo: "Virá tempo em que não suportarão a sã doutrina; mas, tendo comichão nos ouvidos, amontoarão para si doutores conforme as suas próprias concupiscências, e desviarão os ouvidos da verdade voltando às fábulas" (2 Tim. 4:3,4), e nós nos encontramos exactamente nesse tempo. Os doutores que seguem os seus desejos carnais porque desviaram os seus ouvidos da verdade, estão em contínuo aumento, e para eles se viram muitos.

Àqueles doutores que não desviaram os seus ouvidos da verdade, alguns profetas procuram desviá-los eles com as suas falsas profecias; certos profetas, para fazer com que os simples rejeitem a sã doutrina, procuram fazê-la passar como inadequada aos nossos tempos, como uma doutrina que tem que ser revista, mas a doutrina de Deus não é de modo nenhum para rever, e ai daqueles que o procuram fazer, eles levarão a pena da sua rebelião, quem quer que eles sejam.

A propósito do ministério de profeta, quero dizer-vos que não é verdade que o pastor é forçosamente também profeta, porque fala de coisas vindouras escritas na Palavra de Deus, como a vinda do Senhor e outros eventos que ainda devem cumprir-se. Um pastor pode também ser profeta, mas quando Deus lhe dá também este ministério; doutra forma se Deus lhe deu apenas o ministério de pastor, não importa quanto fale de coisas vindouras que estão escritas, isso não faz dele absolutamente um profeta.

Além disso há os que dizem, por falta de conhecimento, que todos na igreja somos profetas porque quando nós falamos do Senhor aos outros, nós lhes falamos da parte de Deus como faziam os profetas de outrora; esta é uma falsa doutrina, porque o facto que eu esteja evangelizando e proclamando a Palavra de Deus, em nome do Senhor, não significa que eu naquele momento sou um profeta. Também o facto de ter o dom de profecia não significa ser um profeta, porque o profeta além do dom de profecia tem também dons de revelação.

"São todos profetas?" (1 Cor. 12:29); a resposta naturalmente é não, porque o corpo de Cristo não se compõe de um só membro, mas de muitos membros; o de profeta é um dos ministérios constituídos por Deus na Igreja para a edificação do corpo de Cristo.

Alguns dizem que como o Espírito Santo foi derramado, e em todo o crente em Cristo Jesus está o Espírito da verdade que o guia em toda a verdade, assim hoje não há mais necessidade do ministério de profeta na igreja, como ao invés havia necessidade entre os Israelitas debaixo do antigo concerto; mas isso não pode ser demonstrado de maneira alguma com as  Escrituras, portanto não o aceitamos.

Na igreja primitiva houveram profetas; de Judas e Silas, que eram homens distintos entre os irmãos, está dito que eram profetas; na igreja de Antioquia houveram profetasdos quais também são dados os nomes; o ministério de profeta é mencionado entre os ministérios, na carta de Paulo aos Efésios, e numa das suas cartas aos Coríntios. Aos Coríntios, falando sobre a ordem do culto, diz: "E falem dois ou três profetas, e os outros julguem. Mas se a outro, que estiver sentado, for revelada alguma coisa, cale-se o primeiro...e os espíritos dos profetas estão sujeitos aos profetas; porque Deus não é Deus de confusão, mas de paz" (1 Cor. 14:29,30,32,33). Estes são mandamentos do Senhor; Paulo reconhecia o ministério de profeta, e se ele disse: "Falem dois ou três profetas..." (1 Cor. 14:29), ninguém tem o direito de dizer: ‘Os profetas não existem mais’, ou: ‘Aqueles que dizem de sê-lo não devem falar quando a igreja está reunida’. Quem impede um profeta de Deus de exercitar o seu ministério, constitui-se inimigo de Deus, como constituiram-se inimigos de Deus os Israelitas quando proibiram os profetas de profetizar. Deus disse: "Aos profetas ordenastes, dizendo: Não profetizeis. Eis que eu vos apertarei no vosso lugar..." (Amós 2:12,13); estas palavras, Deus as disse a um povo que dizia: "E até os profetas se farão como vento, e a palavra não está com eles" (Jer. 5:13), a um povo teimoso que se opôs aos profetas que falavam da sua parte.

Certo, Paulo disse que aquilo que os profetas dizem deve ser julgado, mas não proibiu aos profetas de falar em assembleia; a apóstolo disse também que se uma revelação for dada a um dos (um dos profetas) que estão sentados, o primeiro deve parar de falar, portanto ele não pensava de maneira nenhuma que Deus tivesse deixado de dar revelações para a igreja (como ao invés alguns pensam).

Cuidai que aqui por revelação não se entende de maneira nenhuma um ensinamento da palavra de Deus (como dizem alguns por falta de conhecimento), porque pouco antes, Paulo diz: "Que fazer, pois, irmãos? Quando vos congregais, tendo cada um de vós um salmo, ou um ensinamento, ou uma revelação, ou um falar em outra língua, ou uma interpretação, faça-se tudo para a edificação" (1 Cor. 14:26), e como podeis ver, o ensinamento é nomeado juntamente com a revelação, precisamente porque não são a mesma coisa.

Hoje, Deus, quando quer dá aos seus profetas, quando a igreja está reunida, visões para a igreja, por meio das quais a igreja é edificada, consolada, confirmada, e repreendida quando necessita ser repreendida. Paulo disse: "Faça-se tudo decentemente e com ordem" (1 Cor. 14:40), portanto também os profetas devem exercitar o seu ministério decentemente, para não criar confusão no seio da igreja; esta é a razão pela qual Paulo diz: "E os espíritos dos profetas estão sujeitos aos profetas; porque Deus não é Deus de confusão, mas de paz" (1 Cor. 14:32,33).

Pelo que respeita ao ministério profético exercitado debaixo do antigo concerto, quando ainda o Espírito não tinha sido derramado sobre toda a carne, vos recordo que é verdade que o Espírito não tinha ainda sido dado, mas é também verdade que Deus ungiu com o Espírito Santo reis que foram guiados por Deus também mediante revelações lhes dadas por meio dos profetas.

Davi tinha sido ungido com o Espírito Santo, e o Espírito Santo estava nele, no entanto Deus lhe falou por meio dos profetas em certas circunstâncias; quando ele estava ainda escondido porque Saul o perseguia, o profeta Gade lhe disse, quando ele estava na fortaleza do rei de Moabe: "Não fiques mais neste lugar forte; vai, e entra na terra de Judá" (1 Sam. 22:5); quando ele se tornou rei e propusera em seu coração o edificar casa ao nome de Deus, Deus o impediu de construir o templo mediante uma revelação dada a Natã, vidente do rei; quando ele se fez culpado de adultério e de homicídio, Deus lhe enviou Natã, o profeta, para repreendê-lo e anunciar-lhe a punição que Deus lhe infligiria pelas suas transgressões; quando ele fez o recenseamento de Israel (coisa que desagradou ao Senhor), Deus lhe enviou Gade para lhe dizer qual castigo queria dentre os três que lhe notificou.

Quis mencionar-vos estes factos para que percebam que apesar de o Espírito estar sobre Davi e em Davi, porque Ele falou pela sua boca, Deus também lhe falou por meio dos seus profetas. Hoje, as coisas não mudaram deste ponto de vista, porque apesar dos crentes terem o Espírito de Deus neles (os que foram cheios dele numa medida maior do que os que ainda não foram cheios dele), e o Espírito os guiar, também, Deus, em algumas circunstâncias da sua vida, lhes fala mediante os profetas (ou com uma profecia ou com visões), exactamente como fazia debaixo do antigo pacto.

Aliás, também o profeta Ágabo teve uma mensagem pessoal para Paulo, quando este estava em Cesaréia, portanto não há nada de estranho se hoje, Deus, em algumas circunstâncias, guia, consola, confirma, repreende os seus, também mediante revelações dadas aos profetas.

Não vejo porque deveriamos dizer: ‘O ministério de profeta não é mais necessário hoje’, e dizer em vez: ‘Mas o de pastor ao invés é necessário’; os ministérios são todos úteis à igreja, nenhum excluído.

Eu digo a vós que dizeis que o ministério de profeta não é necessário hoje, porque o Espírito que está em nós nos guia em toda a verdade: ‘Mas a este ponto, segundo o vosso raciocínio, se vós dizeis que o Espírito da verdade vos guia em toda a verdade, não tendes necessidade também dos pastores que vos conduzem e dos doutores que vos instruem; mas então, porque reconheceis estes ministérios, mas o de profeta não?

Paulo escreveu aos Coríntios: "O olho não pode dizer à mão: Não tenho necessidade de ti; nem ainda a cabeça aos pés: Não tenho necessidade de vós. Antes, os membros do corpo que parecem ser os mais fracos são necessários..." (1 Cor. 12:21,22). Escuta-me, tu que dizes que o ministério de profeta não é necessário hoje na igreja; se o teu olho pudesse falar, e tu lhe ouvisses dizer ao teu pé direito: ‘Escuta, eu não tenho necessidade de ti!’, ficarias contente? Não te aperceberias porventura que há alguma coisa que não está bem? Não verias porventura uma divisão no teu corpo? Mas tu pensas com esta tua afirmação alegrar o Senhor, que é a cabeça da Igreja? Não irmão, estas tuas palavras não agradam de modo nenhum ao Senhor; cai em ti mesmo, reconhece a verdade, e sê sábio, porque o Senhor te diz: "Filho meu, se o teu coração for sábio, alegrar-se-á o meu coração.." (Prov. 23:15).

Agora vos quero dizer algumas coisas acerca dos falsos profetas, para que não ignoreis a sua existência e para que vos guardeis deles.

Pedro disse que na antiguidade os homens santos falaram da parte de Deus, porque inspirados pelo Espírito Santo, mas disse também que surgiram falsos profetas entre o povo, e isso as Escrituras o confirmam, na realidade elas ensinam que por um lado houveram os profetas que falavam pelo Espírito Santo, e pelo outro houveram os falsos profetas que faziam falar a sua língua e diziam: ‘O Senhor diz’, quando o Senhor não lhes tinha falado.

Antes de falar dos falsos profetas, das suas mentiras que profetizaram, e da sua conduta ímpia, quero falar-vos de qual era a conduta do povo de Israel e de como os santos profetas exortaram o povo de Deus a arrepender-se.

Os filhos de Israel abandonaram a sua Rocha e se voltaram para os ídolos das nações circunvizinhas; eles se prostituiram para os ídolos vãos, de facto fabricaram os seus ídolos e os puseram sobre os seus altos lugares onde iam para lhes oferecer os seus perfumes e sacrifícios (chegaram ao ponto de degolar os seus filhos e as suas filhas para oferecê-los aos seus deuses).

Além disso, os Israelitas roubavam, cometiam homicídios, cometiam adultérios, mentiam uns aos outros, e eram gananciosos; pelo que ensina a Escritura, em Israel os mandamentos de Deus foram esquecidos. Deus viu aquele espectáculo de perversidade e provou um grande desgosto, mas Ele não permaneceu indiferente porque suscitou profetas aos quais mandou dar a conhecer a Israel os seus pecados e exortar o seu povo a arrepender-se. Os santos profetas obedeceram a Deus e referiram ao povo rebelde as palavras de Deus; agora vos mencionarei algumas exortações ao arrependimento dirigidas ao povo, que estão escritas nos profetas, para vos fazer compreender como os santos profetas não lisonjearam de modo nenhum os ímpios.

Jeremias disse: "Circuncidai-vos para o Senhor, e tirai os prepúcios do vosso coração, ó homens de Judá e habitadores de Jerusalém, para que a minha indignação não venha a sair como fogo, e arda de modo que ninguém o possa apagar, por causa da maldade das vossas obras" (Jer. 4:4), e ainda: "Vai, pois, e apregoa estas palavras para a banda do norte, e diz: Volta, ó rebelde Israel, diz o Senhor, e não farei cair a minha ira sobre vós; porque benigno sou, diz o Senhor, e não conservarei para sempre a minha ira. Somente reconhece a tua iniqüidade: que contra o Senhor teu Deus transgrediste, e estendeste os teus caminhos para os estranhos debaixo de toda árvore verde, e não deste ouvidos à minha voz, diz o Senhor. Convertei-vos, ó filhos rebeldes, diz o Senhor..." (Jer. 3:12-14).

Ezequiel disse: "Convertei-vos, convertei-vos dos vossos maus caminhos; pois por que razão morrereis, ó casa de Israel?" (Ez. 33:11).

Isaías disse: "Lembrai-vos, disto, e considerai; trazei-o à memória, ó transgressores!... Lavai-vos, purificai-vos, tirai de diante dos meus olhos a maldade dos vossos atos; cessai de fazer o mal; aprendei a fazer o bem; buscai a justiça..." (Is. 46:8; 1:16,17).

Deus disse ao povo que se ele se convertesse dos seus maus caminhos, Ele o perdoaria, mas lhe disse também que se não se convertesse, o puniria. Os profetas anunciaram aos rebeldes os juizos que Deus exercitaria contra eles no caso deles continuarem a caminhar segundo a teimosia do seu coração; eis como falaram a tal respeito Isaías e Jeremias.

Isaías disse: "Se quiserdes, e me ouvirdes, comereis o bem desta terra; mas se recusardes, e fordes rebeldes, sereis devorados à espada; porque a boca do Senhor o disse" (Is. 1:19,20).

Jeremias disse: "Mas se não me derdes ouvidos... acenderei fogo nas suas portas, o qual consumirá os palácios de Jerusalém, e não se apagará... eis que enviarei entre vós serpentes, basiliscos, contra os quais não há encantamento; e vos morderão, diz o Senhor" (Jer. 17:27; 8:17), e ainda: "Eis que trarei sobre vós uma nação de longe, ó casa de Israel, diz o Senhor; é uma nação robusta, uma nação antiquíssima, uma nação cuja língua ignorarás, e não entenderás o que ela falar. A sua aljava é como uma sepultura aberta; todos eles são valentes. E comerão a tua sega e o teu pão, que teus filhos e tuas filhas haviam de comer; comerão as tuas ovelhas e as tuas vacas; comerão a tua vide e a tua figueira; as tuas cidades fortes, em que confias, abatê-las-ão à espada" (Jer. 5:15-17). Como reagiram os rebeldes às exortações dos santos profetas? Desta maneira; eles perseguiram os profetas ultrajando-os, ferindo-os, pondo-os em prisões, e por fim os mataram.

Mas eis que juntamente com os santos profetas surgiram também os falsos profetas que se puseram a profetizar do seu ventre; também eles diziam ter visões e sonhos, mas tudo o que diziam usando o nome do Senhor, se opunha à lei e às palavras dos santos profetas. Estes falsos profetas, além de profetizar mentiras, tinham também uma conduta depravada e Deus, disto, dava testemunho deles nestes termos: "Nos profetas de Jerusalém vejo uma coisa horrenda: cometem adultérios, e andam com falsidade, e fortalecem as mãos dos malfeitores, de maneira tal que não se convertam da sua maldade...dos profetas de Jerusalém saiu a contaminação sobre toda a terra... como um leão que ruge, que arrebata a presa; eles devoram as almas, tomam tesouros e coisas preciosas... ensinam-vos vaidades; falam da visão do seu coração, não da boca do Senhor.. e esperam que seja cumprida a palavra... Dizem continuamente aos que me desprezam: O Senhor disse: Paz tereis; e a qualquer que anda segundo o propósito do seu coração, dizem: Não virá mal sobre vós.... clamam: Paz! enquanto têm o que comer, mas preparam a guerra contra aquele que nada lhes mete na boca... adivinham por dinheiro... Não mandei esses profetas, contudo eles foram correndo; não lhes falei a eles, todavia eles profetizaram" (Jer. 23:14,15; Ez. 22:25; Jer. 23:16; Ez. 13:6; Jer. 23:17; Miq. 3:5,11; Jer. 23:21). Da palavra de Deus tiramos estes ensinamentos sobre os falsos profetas:

Ÿ são cobiçosos de torpe ganância, na realidade profetizam também por recompensas em dinheiro, e por consequência, profetizam a paz a quem lhes dá de comer, e a guerra a quem não faz entrar nada nos seus bolsos 

Ÿsão adúlteros

Ÿ amam e praticam a mentira, porque falam de coisas que não viram e de coisas que não ouviram de Deus

Ÿ são injustos, porque contristam o justo com mentiras, quando Deus não o contrista, e fortalecem as mãos dos pecadores para que não se convertam das suas más obras

Ÿ deles dizem muito bem os rebeldes, isto é, aqueles que eles lisonjeiam dizendo-lhes que terão paz e nenhum mal lhes cairá em cima 

A inevitável conclusão à qual chegamos é que os falsos profetas são verdadeiramente más árvores que dão maus frutos; mas como não ficaram impunes os falsos profetas da antiguidade, assim não ficarão impunes os falsos profetas destes dias. Jesus disse que "toda árvore que não dá bom fruto é cortada e lançada no fogo" (Mat. 7:19), portanto nós sabemos que por certo os falsos profetas serão presos e lançados na fornalha de fogo, e cobertos de uma vergonha eterna.

Irmãos, falsos profetas existem muitos deles também nesta geração, guardai-vos deles, para não cair como presa aos seus dentes.

O evangelista

O evangelista é aquele que leva a Boa Nova de cidade em cidade e de aldeia em aldeia; temos um exemplo dele em Filipe, chamado precisamente "o evangelista" (Actos 21:8). Filipe, inicialmente foi eleito juntamente com outros seis irmãos, para servir às mesas, de facto "era um dos sete" (Actos 21:8). Estes sete irmãos que foram eleitos pela multidão dos discípulos, tinham um bom testemunho, eram cheios de Espírito e de sabedoria.

Naquele tempo houve uma grande perseguição contra a igreja que estava em Jerusalém, e todos, salvo os apóstolos, dispersaram-se pelas regiões da Judéia e da Samaria. Aqueles que estavam dispersos andavam de lugar em lugar, anunciando a Palavra, "e descendo Filipe à cidade de Samaria, lhes pregava a Cristo. E as multidões unanimente prestavam atenção ao que Filipe dizia, porque ouviam e viam os sinais que ele fazia; pois que os espíritos imundos saíam de muitos que os tinham, clamando em alta voz; e muitos paralíticos e coxos eram curados" (Actos 8:5-7). Muitos dos Samaritanos creram na Boa Nova e foram batizados por Filipe, conforme está escrito: "Quando creram em Filipe, que lhes pregava acerca do reino de Deus e do nome de Jesus Cristo, batizavam-se homens e mulheres" (Actos 8:12).

O evangelista, segundo o exemplo que temos em Filipe, além de pregar o Evangelho, faz também curas, por isso tem os dons de curar, e tem a autoridade de batizar na água os que crêem no Senhor.

Alguém dirá: ‘Mas que diferença há entre o apóstolo e o evangelista, dado que os dois pregam o Evangelho aos incrédulos? A diferença é que o apóstolo é enviado por Deus a pregar numa outra nação, enquanto o evangelista, na maior parte dos casos, prega na sua nação; além disso, o apóstolo vai pregar onde não existem ainda igrejas, as funda e faz eleger para cada uma delas anciãos, enquanto o evangelista, na maior parte dos casos, chega em lugares onde já existe comunidades, prega o Evangelho e depois se vai.

Segundo o que está escrito no livro dos actos dos apóstolos, há uma outra coisa que distingue o apóstolo do evangelista, e é esta: o apóstolo tem a autoridade de orar pelos crentes para que recebam o Espírito Santo, enquanto o evangelista não tem este dom. Esta é uma conclusão à qual se chega lendo a narração dos factos ocorridos em Samaria. Depois que muitos dos Samaritanos creram e foram batizados por Filipe, "os apóstolos, pois, que estavam em Jerusalém, ouvindo que  Samaria recebera a Palavra de Deus, enviaram para lá Pedro e João; os quais, tendo descido, oraram por eles, para que recebessem o Espírito Santo. Porque sobre nenhum deles tinha ainda descido; mas somente eram batizados em nome do Senhor Jesus. Então lhes impuseram as mãos, e receberam o Espírito Santo" (Actos 8:14-17). Ora se Filipe tivesse tido a mesma autoridade dos apóstolos Pedro e João, não teria havido necessidade de Pedro e João descerem a Samaria para orar por aqueles crentes, para que recebessem o Espírito Santo; enquanto ao invés foi necessário, justamente porque Filipe não tinha o dom de impor as mãos aos crentes para que recebessem o Espírito, não obstante ele mesmo estivesse cheio do Espírito. Também o apóstolo Paulo tinha o dom de impor as mãos aos crentes para que recebessem o Espírito Santo, de facto está escrito, a propósito daqueles cerca de doze discípulos de Éfeso: "Foram batizados em nome do Senhor Jesus. E, impondo-lhes Paulo as mãos, veio sobre eles o Espírito Santo, e falavam em línguas e profetizavam" (Actos 19:5,6); isto confirma o que vos disse antes.

O pastor

O pastor é aquele que é encarregado por Deus para apascentar e para vigiar o seu rebanho.

Pelo que respeita a este ministério, é necessário dizer que o ministério de pastor é mencionado apenas na carta de Paulo aos Efésios. Não há uma só passagem nas Escrituras do novo concerto que diz claramente que alguém era pastor de uma determinada igreja, como ao invés estamos habituados hoje, a ouvir e a ver. Segundo as Escrituras do novo concerto, as igrejas nos tempos dos apóstolos, eram vigiadas e pastoreadas pelos anciãos, em outras palavras, em todas as igrejas haviam vários anciãos (os bispos) que cuidavam das ovelhas do Senhor. As passagens da Escritura que mostram que a dirigir as igrejas haviam anciãos (os bispos), iguais entre eles em grau, poderes e funções, e que não fazem menção da existência de um pastor a cabeça das igrejas, são estas:

Ÿ Livro dos actos dos apóstolos: Paulo "de Mileto mandou a Éfeso chamar os anciãos da igreja. E, logo que chegaram junto dele, disse-lhes:... Cuidai pois de vós mesmos e de todo o rebanho sobre o qual o Espírito Santo vos constituiu bispos, para apascentardes a igreja de Deus..." (Actos 20:17,18,28); Paulo e Barnabé "havendo-lhes feito eleger anciãos em cada igreja e orado com jejuns, os encomendaram ao Senhor em quem haviam crido" (Actos 14:23); "Então pareceu bem aos apóstolos e aos anciãos com toda a igreja escolher homens dentre eles e enviá-los a Antioquia com Paulo e Barnabé, a saber: Judas, chamado Barsabás, e Silas, homens distintos entre os irmãos..." (Actos 15:22); "E os discípulos determinaram mandar, cada um conforme o que pudesse, socorro aos irmãos que habitavam na Judéia; o que eles com efeito fizeram, enviando-o aos anciãos por mão de Barnabé e de Saulo" (Actos 11:29,30); "E no dia seguinte Paulo entrou conosco em casa de Tiago, e todos os anciãos vieram ali..." (Actos 21:18).

Ÿ Epístola aos Filipenses: "Paulo e Timóteo, servos de Cristo Jesus, a todos os santos em Cristo Jesus que estão em Filipos, com os bispos e diáconos..." (Fil. 1:1).

Ÿ Paulo a Timóteo: "Não desprezes o dom que há em ti, o qual te foi dado por profecia, com a imposição das mãos do presbitério (colégio dos anciãos)... Os anciãos que governam bem sejam estimados por dignos de duplicada honra, especialmente os que trabalham na pregação e no ensino..." (1 Tim. 4:14; 5:17).

Ÿ Tiago: "Está alguém entre vós doente? Chame os anciãos da igreja, e orem sobre ele, ungido-o com azeite em nome do Senhor; e a oração da fé salvará o doente, e o Senhor o levantará; e, se houver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados" (Tiago 5:14,15).

Ÿ Pedro: "Aos anciãos, que estão entre vós, admoesto eu, que sou também ancião com eles...Apascentai o rebanho de Deus que está entre vós...Semelhantemente vós, mancebos, sede sujeitos aos anciãos" (1 Ped. 5:1,2,5).

Ÿ Epístola aos Hebreus: "Obedecei aos vossos condutores, e sujeitai-vos a eles; porque velam por vossas almas, como aqueles que hão de dar conta delas..." (Heb. 13:17).

Como podeis ver, em todas estas passagens são mencionados os anciãos da igreja, e nunca o pastor da igreja.

Agora porém é necessário dizer também isto: não é pelo facto de o ministério de pastor ser mencionado uma só vez no novo concerto, e de nunca se falar em nenhum lugar do pastor de uma igreja, que se deve dizer que é errado que numa igreja haja um pastor coadjuvado pelos anciãos. Alguém dirá: ‘Mas então o facto de haver um pastor a cabeça de uma comunidade, com um conselho dos anciãos, tem algum fundamento escritural?’ Sim, o fundamento escritural o possui e é este.

Jesus disse a João para escrever aos anjos das sete igrejas da Ásia; alguém dirá: ‘Mas quem eram aqueles anjos? Certamente não eram espíritos (como ao invés são os anjos do céu), porque por aquilo que o Senhor lhes disse se percebe claramente que eles eram homens da mesma natureza que nós, que no seio daquelas igrejas exercitavam um ministério. Que eles exercitavam um ministério é confirmado por estas palavras do Senhor ao anjo da igreja de Tiatira: "Eu conheço...o teu ministério" (Ap. 2:19). Quereria vos fazer notar uma coisa; a Escritura diz que Paulo "de Mileto mandou a Éfeso chamar os anciãos da igreja" (Actos 20:17), mas a Palavra também mostra que quando João o apóstolo ainda era vivo, havia o anjo da igreja de Éfeso, de facto o Senhor ordenou a João para escrever ao anjo da igreja de Éfeso (e não aos anjos da igreja de Éfeso). O Senhor não disse a João para escrever aos anciãos daquela igreja, mas ao seu anjo; isto nos faz compreender que este anjo era o pastor daquela comunidade.

Além disso, João diz que quando lhe apareceu o Senhor, "ele tinha na sua destra sete estrelas" (Ap. 1:16); aquelas sete estrelas eram os anjos das sete igrejas da Ásia, de facto Jesus lhe disse: "As sete estrelas são os anjos das sete igrejas.." (Ap. 1:20). O facto de o pastor de uma igreja ser representado por uma estrela não deve ser subvalorizado. Jesus, que é o Sumo Pastor, é a resplandecente estrela da manhã; os pastores por ele estabelecidos sobre as igrejas são as estrelas que ele tem na sua mão.

As estrelas que Deus pôs no firmamento dos céus servem para dar luz na noite, mas servem também para guiar as pessoas, na realidade elas são um seguro ponto de referência para os que se encontram desprovidos de uma bússola no meio de um deserto ou no meio do mar. Também os pastores são postos na igreja para iluminar os fiéis e para conduzi-los por veredas de justiça; vos recordais o que fazia a estrela que apareceu aos Magos no Oriente? A Escritura diz que ela "ia adiante deles, até que, chegando, se deteve sobre o lugar onde estava o menino" (Mat. 2:9). Ora, mas não é porventura verdade que o pastor também vai adiante das ovelhas? Aquela estrela conduziu os magos ao Rei dos Judeus; tomai a expressão que diz "até que, chegando, se deteve sobre o lugar onde estava o menino" (Mat. 2:9), e confrontai-a com estas palavras de Paulo aos Éfesios: "E ele mesmo deu...outros para pastores...até que todos cheguemos à unidade da fé, e ao pleno conhecimento do Filho de Deus, a varão perfeito, à medida da estatura completa de Cristo..." (Ef. 4:11,13); e compreendereis como as estrelas das igrejas (os pastores) foram postas por Deus na sua Igreja, para conduzir os santos ao pleno conhecimento do Filho de Deus.

Resumindo, dizemos que todas as igrejas de Deus têm um colégio de anciãos, mas enquanto algumas têm só anciãos, iguais entre eles em grau, poderes, e funções, (nenhum dos quais é chamado pastor, mas de facto pastoreiam), outras, além dos anciãos têm também um pastor que é o presidente do conselho dos anciãos, o seu porta-voz, e aquele que, de facto, tem uma autoridade maior que a dos anciãos. Uma coisa é certa; em ambos os casos, os fiéis não são deixados a si mesmos, porque estão sob a vigilância de condutores.

Vejamos agora como os pastores devem apascentar o rebanho do Senhor. O apóstolo Pedro, a quem o Senhor tinha dito, antes de ir para o céu: "Apascenta as minhas ovelhas" (João 21:17), explicou claramente de que maneira os pastores devem apascentar o rebanho de Deus; ele diz: "Apascentai o rebanho de Deus, que está entre vós, tendo cuidado dele, não por força, mas voluntariamente segundo Deus; nem por torpe ganância, mas de bom ânimo; nem como tendo domínio sobre os que vos foram confiados, mas servindo de exemplo ao rebanho. E, quando aparecer o sumo Pastor, alcançareis a incorruptível coroa de glória" (1 Ped. 5:2-4).

Quero dizer antes de tudo que o rebanho é de Deus, ou seja, é propriedade de Deus; Ele o comprou por preço, e isto o confirmou também Paulo, quando falando aos bispos da igreja de Éfeso, disse-lhes: "Cuidai pois de vós mesmos e de todo o rebanho sobre o qual o Espírito Santo vos constituiu bispos, para apascentardes a igreja de Deus, que ele adquiriu com seu próprio sangue" (Actos 20:28). Porque quis fazer esta premissa? Porque existem alguns pastores que chamam a igreja de Deus ‘a sua igreja’, ‘as suas ovelhas’ e isso não é verdade, porque as ovelhas que os pastores devem apascentar são do Senhor, de facto o Senhor Jesus disse a Pedro: "Apascenta as minhas ovelhas" (João 21:18), e não: ‘Apascenta as tuas ovelhas’.

O pastor deve apascentar o rebanho de Deus não de má vontade ou por força, como se fosse uma coisa desagradável e inútil fazer, mas com alegria, mostrando boa vontade em fazê-lo; o pastor não deve apascentar o rebanho de Deus para enriquecer, explorando as ovelhas do Senhor, portanto não deve fazê-lo porque impelido pela cobiça, mas deve apascentá-lo sinceramente com uma consciência pura; o pastor não deve ter domínio sobre as ovelhas que o Senhor lhe confiou, ou seja, não deve governar com violência e dureza, mas deve ser humilde. Jesus disse: "Se alguém quiser ser o primeiro, será o derradeiro de todos e o servo de todos" (Mar. 9:35); por isso, o Senhor não condena quem quer ser primeiro ou grande entre o seu povo, mas lhe diz o que deve fazer para se torná-lo. Muitos querem ser servidos, mas não querem servir, querem ser grandes e estar entre os primeiros, caminhando segundo a teimosia dos seus corações, recusando humilhar-se e servir as ovelhas de Deus; mas como podem pensar estes de ser grandes? Certo, grandes porventura são considerados por outros soberbos como eles, mas certamente não por aquelas ovelhas modestas e símplices que esperam ainda que o pastor deixe de se desinteressar delas e de buscar o seu próprio interesse, para cuidar delas. Alguém dirá: ‘Mas em que consiste este cuidado de que tu falas?’ Consiste em dar um são alimento às ovelhas, em protegê-las dos lobos devoradores, em fortalecer as ovelhas fracas, em curar as doentes, em tratar as feridas, em tornar a trazer as perdidas, e em repreender as que merecem ser repreendidas. Se o pastor cuida de si mesmo e do rebanho de Deus, quando aparecer dos céus o Senhor, ele receberá dele glória e honra.

Alguém dirá: ‘E ao invés, que obterão do Senhor, aqueles pastores que buscam o seu próprio interesse, que dominam as ovelhas do Senhor com violência e dureza, que não cuidam nem deles mesmos e nem da igreja de Deus?’ Cortá-los-á pelo meio, eis o que receberão do Senhor aqueles pastores que em vez de apascentar a igreja de Deus, apascentaram-se a si mesmos. Eis as palavras que Deus dirigiu contra este tipo de pastores, por meio do profeta Ezequiel: "Assim diz o Senhor, o Eterno: Ai dos pastores de Israel que se apascentam a si mesmos! Não devem os pastores apascentar as ovelhas? Comeis a gordura, e vos vestis da lã; matais o cevado; mas não apascentais as ovelhas. A fraca não fortalecestes, a doente não curastes, a quebrada não ligastes, a desgarrada não tornastes a trazer, e a perdida não buscastes; mas dominais sobre elas com rigor e dureza. Assim se espalharam, por não haver pastor; e tornaram-se pasto a todas as feras do campo, porquanto se espalharam" (Ez. 34:2-5).

Jesus Cristo, falando do mercenário, ou seja, daquele que guarda as ovelhas só pelo salário, disse: "O mercenário, que não é pastor, de quem não são as ovelhas, vê vir o lobo, e deixa as ovelhas, e foge, e o lobo as arrebata e dispersa. Ora o mercenário foge, porque é mercenário, e não tem cuidado das ovelhas" (João 10:12,13), ora, o que distingue o pastor do mercenário é que o pastor pastoreia as ovelhas e cuida delas voluntariamente de bom ânimo, e não procurando o seu interesse, mas temendo a Deus, sabendo de dever um dia dar contas ao Senhor de toda a ovelha lhe tocada em sorte, enquanto o mercenário está a guardar as ovelhas só por um salário, mas não se interessa delas como ao invés faz o pastor, e este desinteresse o manifesta continuamente de muitas maneiras, e sobretudo quando vem o lobo, porque ele não o enfrenta para pô-lo em fuga, mas ele mesmo foge, deixando fazer ao lobo todo o mal que quer no meio do rebanho.

Este é o testemunho que Deus deu dos pastores que no tempo do profeta Isaías, estavam encarregues de guardar o rebanho: "Todos os seus atalaias são cegos, nada sabem; todos são cães mudos, não podem ladrar; deitados, sonham e gostam de dormir. E estes cães são gulosos, nunca se podem fartar; e eles são pastores que nada compreendem; todos eles se tornam para o seu caminho, cada um para a sua ganância, todos sem excepção. Vinde, dizem, trarei vinho, e nos encheremos de bebida forte; e o dia de amanhã será como este, ou ainda maior e mais famoso" (Is. 56:10-12). A Escritura descreve assim todos os pastores que não cuidam do rebanho do Senhor; são cegos, portanto incapazes de reconhecer o bem e o mal e incapazes de guiar a igreja por veredas direitas e planas; são sem inteligência espiritual porque não quiseram saber nada da sabedoria de Deus e dos seus conselhos; são comparados a cães mudos, incapazes de ladrar, que gostam de dormir, portanto são atalaias que não guardam o rebanho, porque quando vêem o perigo não ladram, e um cão de guarda que não ladra para que serve? Os maus obreiros vêm para introduzir as suas estranhas doutrinas, e para levar as ovelhas do Senhor atrás deles, mas eles dormemeles estão atarefados a despachar os seus negócios pessoais. Estes não servem o nosso Senhor Jesus Cristo, mas o seu próprio ventre, "e com suaves palavras e lisonjas enganam os corações dos símplices" (Rom. 16:18); as ovelhas confiadas à sua vigilância se dispersam, são presa de falsos profetas e de falsos doutores os quais com facilidade conseguem agarrá-las porque o seu pastor dorme. Jeremias disse: "Porque os pastores se embruteceram, e não buscaram ao Senhor; por isso não prosperaram, e todos os seus rebanhos se espalharam" (Jer. 10:21), e também: "Muitos pastores destruiram a minha vinha, pisaram o meu campo, tornaram em desolado deserto o meu campo desejado" (Jer. 12:10). Aquilo que acontecia em Israel, nos dias dos profetas, acontece também hoje; também hoje são muitos os pastores que destrõem o rebanho de Deus, porque são cobiçosos de torpe ganância; estes pastores perdem as almas porque querem enriquecer e se tornar famosos; eles maldizem e lançam fora as ovelhas que não fazem entrar nada no seu insaciável ventre; eles usam toda a sorte de engano para alcançar os seus malvados fins.

Para estes pastores, se o rebanho do Senhor não se santifica, não importa absolutamente nada; eles não sofrem em ver a corrupção e a mundanidade alastrar entre o rebanho; eles não se afligem em ver as ovelhas se perderem pelos montes da infidelidade, e nem sequer têm compaixão pelas ovelhas fracas e desencorajadas porque são cruéis; eles não se levantam em favor da verdade porque não a amam; eles não cuidam da sua conduta, e se o nome de Deus e a doutrina de Deus são blasfemados por causa dos seus frequentes escândalos, não lhes importa absolutamente nada, porque eles alcançaram um certo grau de fama e podem se permitir (segundo eles) também a operar escândalos, porque muitos crentes ingénuos que ainda estarão dispostos a segui-los e a socorrê-los encontrarão em abundância deles; são adúlteros, amam o dinheiro, zombam em presença de todos, vão divertir-se, são sócios dos adúlteros e dos ladrões e se deleitam na sua companhia; os mandamentos de Deus e o temor de Deus não estão diante dos seus olhos, mas atrás das suas costas; são altivos e incapazes de se humilharem, e contudo "ainda se encostam ao Senhor, dizendo: Não está o Senhor no meio de nós? Nenhum mal nos sobrevirá" (Miq. 3:11), enquanto Deus diz: "Ai deles" (Judas 11).

O doutor

O doutor é aquele que ensina a Palavra de Deus; ele está apto para explicá-la com precisão porque o Senhor lhe comunicou o dom de ensinamento.

Paulo, além de apóstolo, era também doutor; isto o disse ele mesmo a Timóteo, quando lhe escreveu: "Para o que fui (do Evangelho) constituído pregador, e apóstolo, e doutor dos gentios" (2 Tim. 1:11). Lendo as epístolas de Paulo, nos damos conta daquilo que ele ensinava por toda a parte, em todas as igrejas; quem é doutor deve ensinar também ele as coisas que Paulo ensinava.

Paulo, doutor dos Gentios, escreveu aos santos de Colossos: "Ensinando a todo o homem em toda a sabedoria; para que apresentemos todo o homem perfeito em Jesus Cristo" (Col. 1:28), e nós por estas palavras deduzimos que o doutor ensina os santos, segundo a sabedoria que lhe foi dada, a fim de apresentá-los perfeitos em Cristo. Porventura não é verdade que também o ministério de doutor foi dado por Cristo, para o aperfeiçoamento dos santos?

Paulo morou em Corinto "um ano e seis meses, ensinando entre eles a palavra de Deus" (Actos 18:11); em Éfeso, pelo espaço de três anos, o mesmo apóstolo não cessou de admoestar cada um dos santos com lágrimas, e quando ele falou aos anciãos da igreja de Éfeso, disse-lhes: "Vós bem sabeis...como nada, que útil seja, deixei de vos anunciar, e ensinar publicamente e pelas casas…porque nunca deixei de vos anunciar todo o conselho de Deus" (Actos 20:18,20,27). Isto é o que faz um doutor, onde Deus lhe abre uma porta para a Palavra; se detém naquele lugar para ensinar aos fiéis todo o conselho de Deus.

O ensinamento que um doutor dirige aos santos é elementar, quando é dirigido aos meninos em Cristo, recém-nascidos, e perfeito, quando é dirigido a crentes maduros; em ambos os casos, no entanto, o ensinamento é são e útil. Além de Paulo houveram outros, nos seus dias, que foram constituídos por Deus doutores, e de alguns deles estão mencionados os nomes, de facto Lucas escreveu: "E na igreja que estava em Antioquia havia alguns profetas e doutores, a saber, Barnabé e Simeão, chamado Niger, e Lúcio cireneu, e Manaém, que fora criado com Herodes o tetrarca, e Saulo" (Actos 13:1).

Hoje, o termo doutor é usado impropriamente muitas vezes com alguns que não têm de todo este ministério. A Escritura, por doutor não entende um homem que estudou línguas estrangeiras em alguma escola, ou um homem que ensina grego, hebraico e aramaico; certo, porventura para os de fora um tal homem é um doutor, mas para os de dentro o doutor é aquele que ensina a palavra de Deus. Paulo era hebreu e conhecia bem o grego, e quando esteve na Grécia não se pôs a ensinar hebraico, a sua língua nativa, aos crentes gregos, mas a palavra de Deus. Porque digo isto? Porque hoje alguns crentes pensam que o doutor é quem conhece bem a língua grega e a hebraica, e as ensina; eu não digo que o conhecimento do grego antigo e do hebraico seja inútil hoje, mas digo também que conhecer a língua grega e a língua hebraica não significa ser um doutor da palavra. Os tradutores das Sagradas Escrituras, por exemplo, tiveram forçosamente que estudar bem o grego antigo e o hebraico, porque eles tiveram que traduzir em português os manuscritos escritos em hebraico e em grego (nós damos graças a Deus pelo que eles fizeram para nos permitir ler a palavra de Deus na nossa língua), mas seja bem claro que se um tradutor dos Escritos sagrados, conhece o grego e o hebraico, mas não é capaz de explicar aos crentes as várias doutrinas da Palavra de Deus, ele não é um doutor.

Também o facto de que um crente tenha conseguido uma licenciatura ou várias licenciaturas (não importa se a licenciatura em economia e comércio, ou em direito, ou em letras, ou em medicina) e que em virtude dos seus estudos seja capaz de ter um discurso acerca de Deus, não significa que ele é um doutor. Ele pode ser capaz de falar com excelência de palavras, mas se não está apto a ensinar a palavra de Deus, não é um doutor; ele tem o título de doutor que confere a universidade, mas não tem o ministério de doutor que confere o Senhor.

Agora quero falar-vos dos falsos doutores que existem no seio do povo de Deus e o faço, recordando-vos o que o apóstolo Pedro escreveu na sua segunda epístola a propósito destes. Pedro diz: "E também houve entre o povo falsos profetas, como entre vós haverá também falsos doutores, que introduzirão encobertamente heresias de perdição, e negarão o Senhor que os resgatou, trazendo sobre si mesmos repentina destruição. E muitos seguirão as suas dissoluções, e por causa deles será blasfemado o caminho da verdade; e também, movidos pela ganância, e com palavras fingidas, eles farão de vós negócio; a condenação dos quais já de largo tempo não tarda e a sua destruição não dormita. Porque se Deus não poupou a anjos quando pecaram, mas lançou-os no inferno, e os entregou às cadeias da escuridão, reservando-os para o juízo; e não poupou ao mundo antigo, embora preservasse a Noé, pregador da justiça, com mais sete pessoas, ao trazer o dilúvio sobre o mundo dos ímpios; e, reduzindo a cinza as cidades de Sodoma e Gomorra, condenou-as à destruição, havendo-as posto para exemplo aos que vivessem impiamente; e livrou o justo Ló, atribulado pela vida dissoluta dos homens abomináveis  (porque este justo, habitando entre eles, afligia todos os dias a sua alma justa, pelo que via e ouvia sobre as suas obras injustas); assim, sabe o Senhor livrar da tentação os piedosos, e reservar os injustos para o dia do juízo, para serem castigados; especialmente aqueles que, seguindo a carne, andam em imundas concupiscências, e desprezam toda autoridade. Atrevidos, arrogantes, não receiam blasfemar das dignidades, enquanto que os anjos, embora maiores em força e poder, não pronunciam contra eles juízo blasfemo diante do Senhor. Mas estes, como animais irracionais, por natureza feitos para serem presos e mortos, blasfemando do que não entendem, perecerão na sua corrupção, recebendo o galardão da sua injustiça; pois que tais homens têm prazer em deleites à luz do dia; nódoas são eles e máculas, deleitando-se em seus enganos, quando se banqueteiam convosco; tendo os olhos cheios de adultério e não cessando de pecar; engodando as almas inconstantes, tendo um coração exercitado na avareza, filhos de maldição; os quais, deixando o caminho direito, erraram seguindo o caminho de Balaão, filho de Bosor, que amou o prêmio da injustiça, mas teve a repreensão da sua transgressão: o mudo jumento, falando com voz humana, impediu a loucura do profeta. Estes são fontes sem água, nuvens levadas pela força do vento para os quais a escuridão das trevas eternamente se reserva. Porque, falando coisas mui arrogantes de vaidades, engodam com as concupiscências da carne, e com dissoluções, aqueles que se estavam afastando dos que andam em erro; prometendo-lhes liberdade, sendo eles mesmos escravos da corrupção; porque de quem um homem é vencido, do mesmo é feito escravo. Porquanto se, depois de terem escapado das corrupções do mundo pelo pleno conhecimento do Senhor e Salvador Jesus Cristo, forem outra vez envolvidos nelas e vencidos, tornou-se-lhes o último estado pior que o primeiro. Porque melhor lhes fora não terem conhecido o caminho da justiça, do que, conhecendo-o, desviarem-se do santo mandamento que lhes fora dado. Deste modo sobreveio-lhes o que por um verdadeiro provérbio se diz: O cão voltou ao seu próprio vómito, e a porca lavada ao espojadouro de lama" (2 Ped. 2:1-22).

Antigamente surgiram no meio do povo de Israel também falsos profetas, os quais profetizavam do seu ventre, seguindo seu próprio espírito; isto é o que ensina a Escritura.

Ora, Pedro disse que assim como tinham surgido falsos profetas entre o povo, assim haveriam no meio de nós falsos doutores; sim, entre nós mesmo, porque ele diz: "Entre vós haverá também falsos doutores" (2 Ped. 2:1), por isso ponde muita atenção nas palavras de Pedro, a fim de poder reconhecer estes impostores quando venham a vós.

Estes falsos doutores são astutos como as raposas, e conseguem com a sua esperteza introduzir na igreja estranhas e perversas doutrinas; "andam falando mentiras…chocam ovos de basilisco…o que comer dos ovos deles morrerá" (Is. 59:4,5), diz o profeta Isaías, e de facto aqueles que aceitam as suas heresias de perdição se desviam da verdade. Estes negaram o Senhor que os resgatou, isso significa que houve um dia no qual eles creram no Senhor mas depois o abandonaram.

Estes obreiros fraudulentos têm prazer em fazer discursos sobre coisas de que não se deve falar; são gente sensual, e alguns, atraidos pela sua sensualidade, os seguem e imitam os seus caminhos, e por causa deles, o caminho da verdade é blasfemado pelos de fora. Mas porque é que os incrédulos se põem a blasfemar o caminho da verdade? Porque estes sedutores que dizem com a boca de estar na verdade, e sobre o caminho da justiça, se comportam pior do que os incrédulos que não conhecem o Senhor! Os falsos doutores amam o dinheiro, e se aproveitam daqueles crentes sinceros e símplices que não têm muito discernimento, extorquindo-lhes dinheiro com as suas palavras doces, mas ao mesmo tempo fingidas. Os pretextos que estes usam para arrancar o dinheiro da mão aos crentes, são os mais variados; eles no entanto, sabei isto, não vos dizem: ‘Dai-nos o vosso dinheiro, porque queremos comprar carros luxuosos, construir palácios de prazer, e nos irmos divertir’, mas vos dizem: ‘Dai-nos as vossas ofertas para a obra do Senhor e Deus abençoará a obra das vossas mãos, Ele encherá os vossos celeiros e fará transbordar de vinho os vossos lagares’, belas palavras que estes servos de Mamom conhecem bem e recitam bem diante das multidões que vão escutar os seus áridos discursos. Judas Iscariotes era um apóstolo, e quando Maria tomou um arratel de unguento de nardo puro, de grande preço, e ungiu com ele os pés de Jesus, ele disse: "Por que não se vendeu este unguento por trezentos dinheiros e não se deu aos pobres?" (João 12:5); não é que Judas Iscariotes disse para fazer alguma coisa de inútil com aquele unguento de grande preço, de modo nenhum, ele disse que se teria podido vender e dar o dinheiro aos pobres. Mas o que ele disse, o disse, "não pelo cuidado que tivesse dos pobres, mas porque era ladrão, e tinha a bolsa, e tirava o que ali se lançava" (João 12:6); os falsos doutores falam de uma maneira similar, de facto falam de querer ajudar os pobres, de querer difundir a palavra do Senhor e exortam as pessoas a dar-lhes dinheiro para estas boas causas, mas depois se vem a saber que vivem em casas que são de reis, que possuem carros fora de série, que só vestem roupas de marca, que usam relógios de ouro, e que fazem uma vida escandalosa. Estes são ladrões como o era Judas, mas não ficarão impunes, porque Deus, a seu tempo, lhes retribuirá segundo as suas obras.

Deus não teve por inocentes os anjos que deixaram a sua primeira dignidade e cometeram fornicação com as filhas dos homens, mas os lançou nas trevas que estão nas profundidades da terra, onde estão ainda guardados em cadeias, para o juizo do grande dia.

Deus não teve por inocente também o mundo dos ímpios nos dias de Noé, de facto o puniu, fazendo vir o dilúvio das águas sobre ele, e exterminando tanto os homens como os animais que estavam sobre a face da terra, conforme está escrito: "Assim, foi desfeita toda a substância que havia sobre a face da terra, desde o homem até ao animal, até ao réptil, e até à ave dos céus" (Gen. 7:23); do meio das águas, Deus salvou Noé com outros sete, conforme está escrito: "E ficou somente Noé e os que com ele estavam na arca" (Gen. 7:23), e também: "Poucas (isto é, oito) almas se salvaram pela água" (1 Ped. 3:20).

Deus não teve por inocentes nem ainda Sodoma e Gomorra e as cidades circunvizinhas, as quais viviam no orgulho, na fartura de pão e no ócio indolente; mas não fortaleciam a mão do aflito e do pobre. Eles se tinham abandonado à fornicação e tinham ido atrás de vícios contrários à natureza, e Deus fez chover sobre eles fogo e enxofre, reduzindo-as a cinzas, para que servissem de exemplo aos que no futuro viveriam impiamente, mas também neste caso, Deus manifestou a sua justiça, não fazendo perecer no castigo daquelas cidades o justo Ló que habitava no meio daquela gente perversa e atormentava continuamente a sua alma justa por causa das suas más obras.

Estas histórias nos ensinam que Deus ama a justiça e sabe como livrar os devotos da tentação, mas também que Ele faz cair sobre a cabeça dos ímpios toda a sua maldade. Sabei que Deus julgará os injustos, os que caminham segundo os desejos da carne, e os que desprezam as autoridades; e os falsos doutores estão entre estes, porque estão cheios de toda a injustiça, caminham segundo as concupiscências carnais, e desprezam as autoridades.

Estes impostores desprezam e ultrajam as autoridades que foram ordenadas por Deus, como soberanos, governadores, ministros do governo, magistrados e juizes dos tribunais; eles não honram quem nós devemos honrar. Está escrito na lei: "O príncipe dentre o teu povo não maldirás" (Ex. 22:28), e Salomão diz: "Nem ainda  no teu pensamento amaldiçoes ao rei" (Ecl. 10:20), mas estes não prestam nenhuma atenção a estes mandamentos porque são arrogantes. Mas além disso, dizem também mal das dignidades, na realidade injuriam o príncipe deste mundo e os principados e as potestades, enquanto os anjos de Deus, se bem que sejam maiores dignidades em força e poder, não levam contra eles, perante o Senhor, nenhum juízo maldizente, e isto é confirmado por Judas que diz na sua epístola: "Vituperam as dignidades. Mas o arcanjo Miguel, quando contendia com o diabo, e disputava a respeito do corpo de Moisés, não ousou pronunciar juízo de maldição contra ele; mas disse: O Senhor te repreenda" (Judas 8,9). Recordai-vos que Jesus Cristo chamou o diabo "o príncipe deste mundo" (João 14:30), e que quando Jesus foi tentado pelo diabo, não ousou nem sequer Ele, que era o Filho de Deus, injuriar a dignidade, na realidade quando o adversário tentou o Senhor para que se prostrasse diante dele e o adorasse, Jesus lhe respondeu assim: "Vai-te, Satanás, porque está escrito: Ao Senhor teu Deus adorarás, e só a ele servirás" (Mat. 4:10; Deut. 6:13); ele não lhe disse frases do tipo ‘Agora.....te faço ver eu’, ou ‘Se não te vais daqui te mando à......’ (estas e outras abomináveis expressões são proferidas contra as dignidades por homens corruptos e arrogantes que pregam o Evangelho, mas a coisa mais triste é constatar que muitos crentes quando os ouvem se põem a rir e a dizer também ‘amen’), e isto me encontro forçado a vos dizê-lo, para vos fazer compreender que Jesus, apesar de saber quantas coisas malvadas o diabo tinha feito e dito até então e apesar de saber ser muito mais poderoso que o diabo, não ousou injuriá-lo para fazer zombaria dele. Jesus Cristo nos deixou o exemplo também nisto, mas estes falsos doutores não querem seguir o exemplo de Cristo, porque são arrogantes, audazes, e alcunham o diabo com os mais variados e ridículos nomes para injuriá-lo.

O profeta Zacarias escreveu: "E me mostrou o sumo sacerdote Josué, o qual estava diante do anjo do Senhor, e Satanás estava à sua mão direita, para se lhe opor. Mas o Senhor disse a Satanás: O Senhor te repreende, ó Satanás; sim, o Senhor, que escolheu Jerusalém, te repreende..." (Zac. 3:1,2); isso significa que também Deus quando repreendeu Satanás lhe dirigiu as mesmas palavras que o arcanjo Miguel lhe dirigiu quando se encontrou a contender com ele, por isso irmãos, estai atentos para não vos deixardes levar no erro destes perversos. Estes homens reprovados quanto à fé, "dizem mal do que não sabem; e, naquilo que naturalmente conhecem, como animais irracionais se corrompem" (Judas 10), de facto alguns deles são também sodomitas. "E, como eles se não importaram de ter conhecimento de Deus, assim Deus os entregou a um sentimento perverso, para fazerem coisas que não convêm" (Rom. 1:28); eles, enquanto estão ainda neste mundo, já recebem "em si mesmos a recompensa que convinha ao seu erro" (Rom. 1:27), mas também no mundo vindouro não ficarão impunes porque Deus lhes fará encontrar o salário da conduta que eles tiveram sobre a terra.

Uma outra obra da carne na qual eles têm prazer é o viver diariamente em delícias, de facto banqueteiam sem temor em pleno dia, embriagando-se com os seus velhos vinhos e as suas bebidas fortes. Também nas festas de amor se abandonam às delícias, e é por isto que Judas diz que "estes são manchas em vossas festas de amor" (Judas 12). Mas sabeis o que fazem mais nas festas de amor? Deleitam-se em seus enganos perpetrados para dano dos símplices. Estes, como profanos zombadores de festas, se deleitam em entreter o seu auditório com os seus gracejos indecentes; são homens que têm os olhos cheios de adultério que não podem deixar de pecar e este é o testemunho que Deus dá destes: "Como cavalos bem fartos, levantam-se pela manhã, rinchando cada um à mulher do seu companheiro" (Jer. 5:8).

Estes falsos doutores engodam aquelas almas que não estão estáveis na verdade; são definidos por Pedro, "filhos de maldição" (2 Ped. 2:14) porque eles têm prazer em maldizer o seu próximo; eles, naquele dia, estarão entre aqueles a quem o Senhor dirá: "Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos!" (Mat. 25:41).

Eles estavam no caminho direito, mas o abandonaram e por amor do desonesto ganho se atiraram ao erro de Balaão; são fontes sem água, e nuvens sem água levadas de uma para outra parte por todo o vento de doutrina que sopra. Dizei-me: ‘Mas para que serve uma fonte sem água a quem está sedento?’ Estes estão vazios da sabedoria divina, mas cheios da sabedoria diabólica; estão vazios da sã doutrina, mas cheios de fábulas e de falsas doutrinas, por isso não são de nenhuma edificação para aqueles crentes que caminham segundo o Espírito e discernem a voz do Senhor; mas não obstante isso conseguem conquistar as multidões, sabem fazer, o devemos reconhecer, mas aliás também Pedro disse que "falando coisas mui arrogantes de vaidade, engodam com as concupiscências da carne, e com dissoluções, aqueles que se estavam afastando dos que andam em erro" (2 Ped. 2:18), portanto não é de admirar o ‘seu sucesso’. Judas disse "a sua boca diz coisas muito arrogantes, admirando as pessoas por causa do interesse" (Judas 16); isso significa que dizem muitas coisas que não correspondem à verdade, e que lisonjeiam as pessoas que os ouvem para ganharem o seu favor. Uma das características destes faladores vãos é que prometem a liberdade a todos os que conseguem engodar, na verdade têm todos os seus expedientes para libertar as pessoas de todos os vícios e de todos os problemas, enquanto eles mesmos são escravos da corrupção porque se deixaram envolver e vencer de novo pelas contaminações do mundo das quais um dia tinham fugido. O seu último estado tornou-se pior que o primeiro; por isso Judas os defeniu "árvores murchas, infrutíferas, duas vezes mortas, desarraigadas" (Judas 12). Irmãos, guardai-vos dos falsos doutores.

Conclusão

Depois de ter dito isso; antes de terminar, quero dizer-vos que Cristo deu aos homens estes dons de ministério, para o aperfeiçoamento dos santos, e para que a igreja de Deus seja edificada e não haja nenhuma divisão nela. Deus, por meio dos seus ministros, quer fazer-nos chegar a uma união perfeita na fé em Cristo Jesus, a um completo conhecimento do Filho de Deus, à medida da estatura perfeita de Cristo, para deixarmos de ser meninos que são lançados e levados em roda por ventos de estranhas doutrinas que sopram à nossa volta nesta geração corrupta e perversa. Existem homens fraudulentos que são exercitados a praticar aquela que é chamada a "astúcia tendente à maquinação do erro" (Ef. 4:14), e Deus para nos livrar dos dentes destes que se transfiguram em ministros da justiça, mas que na realidade são ministros de Satanás, constituiu na igreja, os apóstolos, os profetas, os evangelistas, os pastores e os doutores, desejando que cada um de nós, caminhando na verdade e na caridade, cresça em sabedoria, em conhecimento, e na graça.

Que dizer da presença de falsos apóstolos, de falsos profetas e de falsos doutores no meio do povo de Deus? Irmãos, é necessário que eles existam, porque está escrito: "E até importa que haja entre vós facções [ou seitas], para que os aprovados se tornem manifestos entre vós" (1 Cor. 11:19); o sei, estas palavras de Paulo aos santos de Corinto, são fortes, mas é necessário reconhecer que no seio da igreja de Deus, no curso dos séculos, surgiram muitos falsos profetas e muitos falsos doutores que introduziram encobertamente doutrinas perversas e arrastaram atrás deles os que lhes prestaram fé; mas é também verdade que muitos crentes não se deixaram seduzir por estes  enganadores, e permaneceram firmes na fé no Senhor Jesus Cristo e na sã doutrina que nos foi ensinada pelo nosso Senhor e pelos apóstolos, e batalharam pela fé. Sim, houveram homens de Deus que no meio da boa guerra não recuaram, mas com as armas de Deus guerrearam até ao fim das suas vidas; e foi justamente a seguir às duras lutas e aos muitos sacrifícios destes homens corajosos que Deus levantou no curso do tempo, que o Evangelho chegou até nós; e foi a seguir à obra fiel de muitos tradutores, que as Sagradas Escrituras nos chegaram integras. O diabo levantou os seus perversos ministros que torceram as Escrituras para a sua perdição e a perdição de muitas almas, mas o puro Evangelho nos chegou o mesmo e por meio dele fomos salvos dos nossos pecados.

Nós que cremos no nome do Filho de Deus damos graças a Deus porque Ele nos fez chegar ao conhecimento da verdade e porque Ele convosco nos mantém firmes em Cristo. A ele seja dada a glória, assim agora, como até o dia da eternidade. Amen.

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